Pesquisa traz modelo inovador com IA para ensino em laboratórios de Química Analítica

Uma pesquisa com participação da USP apresenta uma proposta inovadora para o ensino em laboratórios de Química Analítica. O estudo, publicado na revista científica Analytical and Bioanalytical Chemistry, propõe um modelo prático, escalável e apoiado por inteligência artificial (IA) para aproximar teoria e prática em aulas experimentais.
O artigo descreve uma abordagem didática baseada no conceito de “laboratório invertido” (flipped lab), no qual o conteúdo teórico é explorado previamente pelos estudantes, reservando o tempo de aula para atividades reflexivas, tomadas de decisão e discussões analíticas.
“Esse artigo nasceu da nossa inquietação com uma lacuna persistente no ensino de Química Analítica: a dificuldade que os alunos enfrentam para conectar os conceitos teóricos com as atividades experimentais realizadas em laboratório. A proposta de inverter o laboratório, posicionando a preparação teórica para antes da aula prática, amplia o espaço para o diálogo, a tomada de decisões e a reflexão durante a atividade experimental”, detalha Paulo Correia, coordenador do curso de Licenciatura em Ciências da Natureza da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP no campus leste da capital paulista.
No trabalho, os pesquisadores explicam que a proposta busca promover um aprendizado conceitual, evitando aulas repletas de procedimentos em que os alunos seguem instruções, geram dados e concluem relatórios, mas raramente refletem sobre por que as técnicas, parâmetros ou decisões específicas são importantes. Esse fenômeno é conhecido como lacuna teoria-prática.
“Um exemplo na Química Analítica: os alunos compreendem os princípios de funcionamento dos instrumentos para realizar análises químicas, mas não conseguem realizar as etapas práticas, tais como seleção da amostra (amostragem), preparação da amostra para análise, configuração do equipamento para as melhores condições de funcionamento e realização das medidas instrumentais”, afirma Correia.
Apoio da IA
Um dos principais diferenciais da proposta está na utilização de ferramentas baseadas em IA, como o ChatGPT, para apoiar a elaboração de materiais pedagógicos — entre eles vídeos, questionários, roteiros de experimentos e guias de reflexão. Esses recursos são adaptados pelos docentes de acordo com o contexto e objetivos da disciplina, contribuindo para uma aprendizagem mais ativa e autônoma.
A estrutura do modelo é dividida em três etapas: preparação prévia com foco nos conceitos fundamentais, experimentação orientada à reflexão crítica, e uma fase posterior dedicada à análise dos resultados e à metacognição – a capacidade de refletir sobre o próprio pensamento, essencial para promover uma aprendizagem mais profunda e o raciocínio independente. Essa sequência favorece o desenvolvimento do raciocínio analítico dos estudantes, substituindo abordagens meramente procedimentais por práticas que estimulam justificativas e decisões baseadas em critérios científicos.
De acordo com os autores, o modelo é acessível e pode ser facilmente adaptado a diferentes contextos acadêmicos, inclusive em instituições com recursos limitados. Além disso, oferece uma alternativa viável para docentes que buscam inovar suas práticas pedagógicas sem comprometer a profundidade conceitual dos conteúdos.
“A IA pode ser uma aliada nesse processo, ajudando professores a criarem materiais personalizados com mais agilidade, mesmo sem formação específica em didática. Esperamos que o modelo apresentado no artigo inspire outros docentes a repensarem o papel formativo das atividades experimentais realizadas em laboratórios”, diz Correia.
O trabalho é fruto de uma colaboração internacional que inclui os pesquisadores Ian M. Kinchin (University of Surrey, Reino Unido), Thiago Paixão (Instituto de Química da USP) e David T. Harvey (DePauw University, Estados Unidos), liderados pelo professor Paulo Correia da EACH/USP. A pesquisa contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e reforça o compromisso da USP com a inovação no ensino superior e com a formação de profissionais críticos e preparados para os desafios da ciência contemporânea.
O artigo Flipping the lab with AI support: a scalable model to address the theory–practice gap in analytical chemistry education está disponível on-line e pode ser acessado neste link.
Mais informações: prmc@usp.br, com Paulo Correia; trlcp@iq.usp.br, com Thiago Paixão
* Com texto da Imprensa EACH. Editado por Tabita Said
Matéria – Jornal da USP
Texto: Redação*
Arte: Gustavo Radaelli**