O detector de íons na espectrometria de massas
Joseph John Thomson desenvolveu o primeiro espectrômetro de massas no ano de 1897. As partes do primeiro espectrômetro já foram descritas na revista ANALYTICA (Edição 96 de Agosto de 2018) e as mesmas são: “Fonte de íons”, “Analisador de massas” e “Detector de íons”. Como detector de íons J.J. Thomson utilizou uma placa fotográfica para registrar o caminho ótico dos íons, obtendo geometrias parabólicas (Figura 1). Por esta configuração, o primeiro analisador de massas foi denominado “Espectrógrafo de massas”.
A função do detector de íons no espectrômetro de massas é transformar as informações do analisador de massas em imagens que auxiliam na percepção do analito em estudo. O detector de íons fornece informações sobre o fluxo de íons ou abundancia de íons após a sua saída do analisador de massas. O detector converte o feixe de íons num sinal elétrico que pode ser amplificado, digitalizado, armazenado e exibido pelo sistema de dados ante os olhos ou ouvidos do ser humano. Sensibilidade, precisão, resolução, tempo de resposta, estabilidade, faixa dinâmica e baixo ruído são as características importantes de todo detector de íons. Os detectores de íons que podem ser utilizados no espectrômetro de massas são os seguintes: Placa fotográfica, Copo de Faraday, Multiplicados de elétrons, Fotomultiplicadora e Multicanal.
As placas fotográficas foram utilizadas de 1897 até 1940 por J.J. Thomson e seu aluno Aston. Hoje em dia, não são mais utilizadas, pela falta de resolução e especialmente pelo elevado ruído interferente, mas graças a este detector foi possível descobrir os elétrons e a maioria dos isótopos, ou seja, tem seu mérito analítico, apesar da obsolescência. O Copo de Faraday foi inventado por Michel Faraday em 1831 e foi testado por Dempster no seu espectrômetro de massas, mas quem o utilizou efetivamente foi Alfred Nier. Até 1940, as medidas da massa dos isótopos eram feitas por meio da distância entre as linhas registradas sobre chapas fotográficas. Nier revolucionou essa metodologia ao propor a utilização de um dispositivo elétrico para eliminar erros sistemáticos obtidos. O detector Copo de Faraday ou “Faraday Cup” em inglês é um copo metálico projetado para capturar partículas carregadas no vácuo (Figura 2). A corrente elétrica resultante pode ser medida e usada para determinar o número de íons atingindo o copo. Os íons positivos que saem do espectrômetro de massa entram no copo metálico que está aterrado. Quando os íons se chocam com as paredes do copo, os mesmos são neutralizados, absorvendo um elétron do copo metálico. A perda de um elétron do copo metálico é medida por um amperímetro interposto entre o copo e o terra. Portanto, quanto maior o número de íons que entram no copo maior a corrente detectada. Uma das melhores características do Copo de Faraday é que todos os íons são detectados com a mesma eficiência, de acordo com suas massas. Desde então, o “Espectrógrafo de massas” se converte em “Espectrômetro de massas”, porque é possível detectar e quantificar as massas dos íons selecionados pelo analisador com maior sensibilidade, precisão, resolução e principalmente baixo ruído interferente, comparado com as placas fotográficas.
O detector de íons denominado “Multiplicador de elétrons” foi desenvolvido por Norman Daly no ano de 1950, sendo o detector de íons mais utilizado na espectrometria de massas devido a sua elevada sensibilidade, comparada com o Copo de Faraday. O Multiplicador de elétrons tem formato de cone metálico, geralmente banhado em ouro, por onde os íons entram na boca do cone (Figura 3). A entrada é fortemente negativa, relativamente ao fim do cone, de tal forma que íons positivos são acelerados em direção à superfície do cone. Na medida em que atingem o seu interior, os íons ejetam elétrons da superfície do cone. Estes elétrons secundários são acelerados em direção ao fim do cone, se chocando com a superfície do mesmo repetidamente e causando a liberação de mais elétrons da superfície. Esta multiplicação do número de elétrons causa a emissão de uma cascata de elétrons no fim do cone. A corrente eletrônica é amplificada para produzir um sinal proporcional à corrente iônica incidente no detector. O gradiente do potencial elétrico no cone é ajustado de tal forma a manter um máximo de elétrons emitidos no fim do cone para cada íon que ingressa no detector. No entanto, existe um limite máximo no cone que pode liberar elétrons por íon, dependendo do desgaste metálico da superfície do cone e outros parâmetros elétricos, necessitando obrigatoriamente ser calibrado periodicamente para atingir este máximo. Por esta razão, o detector de íons Multiplicador de elétrons tem sua vida útil limitada quando comparada ao detector Copo de Faraday. O Multiplicador de elétrons é 1000 vezes mais sensível que o Copo de Faraday.
O detector de íons “Foto multiplicador de elétrons” tem como base o Efeito Fotoelétrico descrito por Albert Einstein, que lhe deu o Nobel de Física. O íon positivo é acelerado e colide sobre uma superfície de alumínio, que libera elétrons secundários, e estes, por sua vez, são aceleradas para um cintilador, direcionadas para uma fotomultiplicadora selada (Figura 4). Num processo chamado emissão secundária, um único elétron pode, quando bombardeado em material emissivo secundário, induzir a emissão de vários elétrons. Se um potencial elétrico é aplicado entre esta placa de metal, os elétrons emitidos vão induzir uma emissão secundária com mais elétrons. Isto pode ser repetido várias vezes, resultando num chuveiro de elétrons, todos recolhidos por um ânodo de metal, onde é medida a corrente elétrica em Amperes. A contagem de elétrons secundários é usado para medir os feixes de íons que atingem a foto multiplicadora. O detector tem um baixo nível de ruído, comparados com outros detectores de íons.
O detector de íons denominado “Detector Multicanal” ou “Multi Channel Plate – MCP” em inglês, foi desenvolvido em 1970 para ser utilizado nos espectrômetros de Tempo de Voo ou “Time of Flight – TOF” em inglês. O MCP está composto de centenas de micro canais contendo cada canal um multiplicador de elétrons (Figura 5). O mesmo apresenta tempo de resposta menor que 1 ns e alta sensibilidade, maior que 50 mV. Apenas alguns poucos canais do MCP são afetados pela detecção de um íon e assim é possível a detecção de muitos íons ao mesmo tempo, onde centenas de íons podem ser geradas em poucos nano segundos.
Os íons com trajetórias estáveis que saíram do analisador de massas são detectados por algum detector de íons descrito anteriormente. O detector de íons transforma a corrente iônica em corrente elétrica, especificamente, em pulsos elétricos medidos temporalmente, na ordem de micro segundos, que geram um gráfico da variação temporal da intensidade dos íons, denominado “Espectro de Massas”. Cada sinal detectado no espectro de massas pode ser relacionado a uma espécie iônica com determinada razão massa/carga (m/z).
A desvantagem de todos os detectores de íons descritos neste trabalho é que só funcionam em alto vácuo, precisando um sistema de alto vácuo.
Fonte: M. Gross [1]
Figura 1: Placa fotográfica utilizada por J.J. Thomson como detector de íons em 1897. Os íons dos diferentes analitos são detectados por meio de figuras parabólicas na placa fotográfica conforme o desenho.
Fonte: O.V. Bustillos [2]
Figura 2: O Copo de Faraday. Íons positivos penetram e se chocam com as paredes do copo metálico. Um amperímetro é interposto entre o copo e o aterramento sendo a corrente eletrônica medida. Esta corrente será proporcional a corrente iônica que penetra no copo.
Fonte: O.V. Bustillos [2]
Figura 3: Multiplicador de Elétrons. Íons positivos atingem o interior do cone, próximo da entrada do multiplicador de elétrons, liberando elétrons que são acelerados na direção do fim do cone devido a um gradiente negativo no cone. Os elétrons se chocam repetidamente com a superfície interna do cone, causando a emissão de mais elétrons.
Fonte: M. Gross [1]
Figura 4: Detector “Foto multiplicador de elétrons”. Os íons atingem um dinodo que geram elétrons que logo após atingir o cintilador da fotomultiplicadora.
Fonte: M. Gross [1]
Figura 5: Detector de íons do espectrômetro de massas denominado Detector Multicanal.
Referências bibliográficas
- Gross and R. Caprioli. “The development of mass spectrometry”. Edit. Elsevier Science Ltd. England. 2016.
- Bustillos, O.V., Sassine, A., March, R. A espectrometria de massas quadrupolar. 1ª. Edição. Scortecci editora, São Paulo. 2003.
Artigo disponível na íntegra também na seção Espectrometria de Massas da Revista Analytica Ed 103.