Entrevista: Carlos Augusto de Azevedo, presidente do Inmetro
Com carreira sólida na academia e com cases de sucesso em gestão, Carlos Azevedo comenta o balanço de sua presidência após seis meses no Inmetro
Por Paolo Enryco
Com pouco mais de seis meses na presidência do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), Carlos Augusto de Azevedo já tem deixado sua marca na administração do instituto. Físico de formação e com doutorado em astrofísica e pós-doutorado pelo Instituto Real de Tecnologia da Suécia, o cientista possui uma carreira acadêmica invejável. Isso porque é membro associado do Centro Internacional de Física Teórica em Trieste na Itália, é editor convidado da revista Physica Scripta, além de já ter lecionando física na Escola Técnica Ferreira Viana, no Instituto Liceu Nilo Peçanha, na Escola Naval, no Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET), na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), entre outras instituições de ensino superior.
Porém, sua carreira não se limitou à academia, mas também na gestão. Entre os anos de 1999 e 2002 ocupou a cadeira de presidente da Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec), onde obteve resultados significantes tanto em expansão, como orçamentário.
E agora, como presidente do Inmetro, Carlos Azevedo já pôde apresentar alguns resultados de sua gestão. Em conversa com a Revista Analytica, adiantou o balanço atual de sua gestão e quais as perspectivas e planos para esse ano.
1. Após pouco mais de seis meses na presidência do Inmetro, qual o balanço notado sobre a situação atual do instituto? E qual a perspectiva do teu trabalho daqui pra frente?
Quando assumimos o Inmetro, verificamos que o instituto teria um déficit financeiro, para manter as atividades, de R$ 120 milhões. Diante dessa situação, recorremos ao Governo Federal, Secretaria do Tesouro, etc., e conseguimos levantar R$ 170 milhões. Hoje o Inmetro está com seu financeiro em ordem. Porém, a ideia é que melhoremos o trabalho esse ano, que consigamos fazer mais coisa.
Praticamente retornamos, em termo de execução orçamentaria, ao melhor momento do Inmetro que foi 2013/2014. Isso conseguimos fazer nesses 6 meses, uma recuperação financeira do Inmetro. Agora vamos expandir as atividades, expandir o trabalho. Esse será um ano de investimento na parte de infraestrutura básica, nos Institutos de pesos e medidas (IPEMs), o que vai viabilizar efetuamos mais trabalhos e consequentemente mais assistência para a sociedade.
2. Há mudanças ou medidas previstas à curto prazo? É possível nos adiantar algumas delas?
Temos um planejamento de investimento nos IPEMs, na infraestrutura básica do campus do Inmetro, estamos criando também um piloto da cidade inteligente, vamos transformar a divisão de informática em instituto de segurança cibernética, cujo objetivo é atender o País todo. Também criando um programa de fusão e educação metrológica com vários cursos.
Ainda, iremos oferecer um grande programa de atuação de talentos para o Inmetro, começando com um programa de visitas de jovens, do 9º ano (ensino fundamental), para que possamos selecionar jovens para iniciação cientifica, para que a partir dali selecionemos alunos para os nossos cursos técnicos, porque temos que começar a investir nessa juventude. E daí ofereceremos um grande programa de mão de obra com residência técnica e tecnologia para reforçar a formação de pessoal nessa área.
3. Qual a importância do parque tecnológico do Inmetro nesse cenário?
A importância é que vamos instalar lá o instituto de segurança cibernética, o laboratório para testes de produtos, montar o laboratório para fazer o teste do produto, quando ele já está nas prateleiras do mercado, para testar aquilo que já está sendo vendido para a população.
4. Tendo em vista seu retrospecto positivo na presidência da Faetec, quais os principais desafios a serem superados encontrados no Inmetro? E quão fundamental é essa experiência, da Faetec, nessa nova empreitada?
A questão que se coloca é que na gestão da Faetec, tivemos lá um bom incremento de orçamento. Quando eu assumi a Faetec ela tinha 60 mil alunos e tinha orçamento de R$ 40 milhões, 3 anos depois 220 mil alunos e R$ 180 milhões de orçamento. E expandimos também para a educação básica e nível superior, além de expansão geográfica para todo o estado do Rio de Janeiro. O mesmo queremos fazer com a Inmetro. Nós já temos uma série de atividades e queremos melhorar, inclusive a interação do Inmetro com o exterior, já temos com programa de colaboração com EUA, França, Alemanha, Coréia do Sul, e melhorar também a interação com os IPEM’s. Queremos seguir a mesma receita da Faetec com o Inmetro, e melhor o orçamento. No ano passado fizemos uma execução recorde de orçamento R$ 673 milhões, para esse ano tentaremos executar R$ 1 bilhão de orçamento.
5. Quando falamos de controle de qualidade, qual o setor que ainda tem mais dificuldades em alcançar excelência?
A questão é que as pessoas, de um modo geral, gostam de coisas melhores. Por isso, sempre, no ponto de vista do controle de qualidade é necessário melhorar, sempre vai ter que avançar. Aqui no Inmetro buscamos isso, seja com a melhoria da precisão como pela diminuição dos erros, além da certificação de mais e melhores laboratórios. Então isso é uma buscar continua, até pela sociedade, afinal, o mundo não para. Então temos que ter em mente que o Inmetro é um organismo que se equipara mundialmente. Por isso, temos que prover a infraestrutura tecnologia para que a indústria brasileira acompanhe essa evolução. Por isso há sempre muito espaço para controle de qualidade, para as áreas correlatas. Continuaremos nas áreas de química, na área de materiais, mas fundamentalmente na biotecnologia. Certamente esse será o século da biotecnologia. Estamos fazendo e vamos continuar fazendo.
6. Sobre metrologia, como o senhor vê o Brasil no cenário mundial? Qual o papel do Inmetro nessa posição?
Ano passado fui na reunião do Escritório Internacional de Pesos e Medidas (BIPM), e notei que o Brasil, pelo Inmetro, está colocado entre os 10 melhores institutos metrológicos do mundo, ou seja, compatível com a econômica brasileira. Porém se observar o investimento, não é proporcional a isso. Se comparar nosso orçamento com os outros, carecemos de multiplicar nosso orçamento em 3 ou 4 vezes. Ou seja, estamos fazendo muito com pouco. Mas se quisermos manter essa posição precisamos fazer investimento firme no Inmetro, para continuarmos nessa posição dos 10 melhores do mundo.
7. Para o bem ou para o mal, quão relevante é a atual instabilidade econômica e política nacional quando falamos em tecnologia e inovação? Devemos ser otimistas ou pessimistas para os próximos anos?
Temos que ser otimista e ver o copo meio cheio. Veja bem, apesar da crise e tudo mais, conseguimos recuperar o orçamento do Inmetro. A questão é de você trabalhar e demonstrar os resultados que trazem para sociedade. Por isso sou otimista, e penso que o Inmetro poderá desempenhar o papel dele, que é dar suporte a indústria nacional. E podemos produzir mais do que produzimos hoje.
Por exemplo, o algodão brasileiro está abaixo de preço de top internacional, porque falta laboratório para certificação do algodão. Outro exemplo, o Brasil vende muita carne congelada, e o Brasil tem que ter carne resfriada, que vale 50% a mais no mercado internacional, e estamos trabalhando em programas nesse sentido.
Tem também a questão do controle de transporte. Estamos fazendo um trabalho junto com o Departamento Nacional De Infraestrutura De Transportes (DNIT) para melhorar o controle de transporte, a pesagem dos caminhões é descontrolada, o que gera danos nas estradas.
Por isso, só vai poder haver inovação se houver desenvolvimento cientifico e estamos trabalhando também nesse sentido.
8. Quais outros setores você vê que precisam desenvolver-se mais na questão de controle de qualidade?
Precisamos fazer a certificação de origem de nossos produtos agrícolas, precisamos melhorar a questão de logística de exportação, para ganhar tempo e consequentemente ganhar preço. Estamos juntos com pesquisadores da USP desenvolvendo toda uma tecnologia para melhorar a velocidade de exportação de produtos, ser menos burocráticos e diminuir tempo para exportação.
9. Sendo que o senhor tem um papel importante no que tange a educação, que tipo de mensagem, conselho ou recomendação que o senhor pode passar para os interessados em ingressar na área de controle de qualidade e metrologia?
O Inmetro vai lançar um programa nacional de residência tecnologia. Vamos abrir um concurso para alunos recém-formados em química, física, matemática, engenharia, por exemplo, para que venham fazer um curso de residência tecnológica e um curso de especialização em metrologia de dois anos dentro dos IPEM’s. O objetivo é fazer isso no Brasil todo. Com isso estaremos mostrando a esses jovens uma possibilidade de trabalho e uma aproximação da área industrial e de controle de qualidade. É muito importante a aproximação da juventude nessa área, ajuda a indústria e melhora o desempenho do Inmetro e dos IPEM’s.