Protocolos para controle de qualidade do leite em tanques refrigerados
A Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) e a Embrapa Gado de Leite (MG) desenvolveram protocolos de higienização de tanque coletivo de armazenamento de leite cru refrigerado. A iniciativa atende a demandas apresentadas pelos próprios produtores de leite de base familiar, que apontaram orientações para limpeza e higiene de ordenha como alguns dos principais problemas enfrentados por eles na comercialização do produto.
Os protocolos vão auxiliá-los no cumprimento das novas exigências impostas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que aumentaram o controle na qualidade e segurança da cadeia produtiva leiteira. As instruções normativas nº 76 e 77, de 2018, preveem, entre outras questões, que os produtores estejam aptos a higienizar de forma adequada os equipamentos de armazenamento de leite.
Terceiro maior produtor mundial de leite
Segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO/ONU), em 2017 o Brasil se tornou o terceiro maior produtor de leite do mundo, com 35 bilhões de litros por ano. O leite cru permanece armazenado no tanque de resfriamento até sua coleta pela indústria. A higienização adequada do tanque de resfriamento mantém a qualidade do leite obtido na propriedade. Já o procedimento inadequado leva à formação de biofilme, uma película na superfície interna que proporciona a proliferação de bactérias e outros microrganismos que contaminam o leite.
“A correta higienização dos equipamentos é uma operação estratégica para manutenção da qualidade do leite cru refrigerado e deve ser realizada imediatamente após a coleta do leite pelo caminhão-tanque do laticínio”, afirma André Dutra, analista da área de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agroindústria de Alimentos e responsável pelo projeto “Estratégia de Manutenção da Qualidade do Leite Cru Refrigerado Armazenado em Tanques Coletivos”.
Foco na qualidade e no aumento do lucro
O trabalho da Embrapa foi desenvolvido na bacia leiteira do sul do estado do Rio de Janeiro e na região da Zona da Mata mineira, com o apoio da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG) e de outros parceiros locais.
Técnicos da Embrapa instalaram duas Unidades Demonstrativas de Referência (URT) com o protocolo de higienização de tanques de armazenamento de leite em municípios dos dois estados e capacitaram cerca de 150 agricultores familiares, que utilizam tanques coletivos, em parceria com a Cooperativa Boa Nova, localizada no município de Valença (RJ), e com a Associação dos Produtores Rurais do Vale de Santana (Aprovas), sediada em Rio Preto (MG).
Os procedimentos validados pela pesquisa contribuem para o aumento do lucro do produtor de leite, do rendimento industrial e da qualidade e segurança dos produtos derivados ofertados ao consumidor final. “Incentivamos a produção de leite de qualidade pelos nossos cooperados. O produtor pode receber um valor a mais por litro de leite, ou ao contrário, pode ser até penalizado. Para isso, apoiamos iniciativas como essa da Embrapa, que o orientam a manter a qualidade do leite”, afirma Júlio César Costa, diretor da Cooperativa Boa Nova.
Segundo o protocolo, o processo de higienização deve ser realizado em duas etapas: limpeza e sanitização. “Normalmente, os produtores de leite realizam apenas a primeira etapa de lavagem do tanque para remoção dos resíduos de leite que ficam aderidos às paredes internas do tanque, o que não é suficiente para a eliminação dos microrganismos”, destaca Dutra.
Além disso, muitas vezes a água utilizada pelos pequenos produtores rurais não recebe tratamento adequado, podendo vir a contaminar novamente a superfície limpa. Por essa razão, o procedimento desenvolvido pelos cientistas incorpora uma segunda etapa de higienização para assegurar a eliminação completa dos microrganismos. Isso é feito com a aplicação de uma solução sanitizante.
Há diversas marcas comerciais no mercado a um baixo custo. Algumas opções, como o dióxido de cloro estabilizado, oferecem a vantagem de não necessitar de enxague após a aplicação, reduzindo assim o uso de água.
Índices de contaminação próximos de zero
Os resultados das análises realizadas pela Embrapa indicaram que após o procedimento de higienização do tanque de leite a Contagem Total de Bactérias (CTB) na superfície interna caiu para índices próximos de zero.
“Realizamos três análises em períodos diferentes, antes e após a coleta do leite. As medições iniciais indicavam a presença de milhões de bactérias por centímetro quadrado e ao fim obtivemos uma contagem menor do que dez, o que indica a eficácia do método de higienização empregado”, conta a pesquisadora Janine Passos, do Laboratório de Microbiologia da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
Também foram realizadas análises da água utilizada na limpeza do tanque e utensílios. “As análises microbiológicas da água mostraram que as condições higiênico-sanitárias melhoraram após o treinamento realizado pelos técnicos da Embrapa com os produtores cooperados. Mesmo assim, recomendamos a realização do procedimento de cloração da água pelo produtor rural”, ressalta a pesquisadora.
Solução foi motivada por demandas do setor produtivo do leite
Os pesquisadores Sérgio Rustichelli Teixeira e Guilherme Nunes de Souza, da Embrapa Gado de Leite, realizaram recentemente uma pesquisa com mais de 150 técnicos das regiões Sul e Sudeste que validou a necessidade de estabelecer protocolos técnicos em diferentes etapas da produção de leite. De acordo com os entrevistados, as principais demandas dos produtores se concentravam em orientações para limpeza, uso correto de detergente, saúde animal, higiene de ordenha e aquisição de equipamentos.
“Uma queixa recorrente de produtores de leite está relacionada à mão de obra, que resiste em seguir orientações relacionadas a questões de higiene, desde a ordenha até a correta limpeza do tanque de armazenamento. Os técnicos atribuem a resistência a questões culturais envolvidas. Os produtores enxergam qualidade como custo e, por isso, insistem em seguir o que já faziam”, revela Rustichelli.
Um dos técnicos entrevistados informou que o produtor avalia que se melhorar a qualidade de leite, vai ganhar só R$ 0,02 por litro de leite, mas precisará realizar um investimento considerado de alto custo.
Mais de 90% dos técnicos entrevistados estavam empregados em indústrias cooperativas de leite, cuja maioria efetuava pagamento por qualidade. De acordo com os entrevistados, a política de pagamento por qualidade se mostrou um instrumento estimulante para as iniciativas com foco na melhoria da qualidade do leite que chega aos laticínios.
“Alguns problemas foram superados apenas apresentando os cálculos aos produtores e evidenciando as recomendações técnicas que podem facilitar o trabalho na fazenda depois que a rotina se estabelece. Assim, os produtores entenderam que se gasta menos do que se perde pela baixa qualidade do leite”, destaca Rustichelli ressaltando que, ao fim, ganham todos os atores da cadeia leiteira, principalmente o consumidor ao ter acesso a produtos lácteos de melhor qualidade.
Apresentação ao produtor
Os protocolos, que foram validados por testes analíticos, serão apresentados na 8ª TecLeite (Tecnologias para a Produção Sustentável de Leite), na Fazenda Experimental da Embrapa, no próximo dia 17 de outubro, em Coronel Pacheco (MG). O evento é uma das ações da Embrapa para transferir novas tecnologias ao sistema agroalimentar do leite e seus derivados. Esse segmento desempenha papel relevante na geração de emprego e renda para mais de um milhão de produtores rurais e no suprimento de alimentos para as populações brasileira e mundial.
Com informações de EMBRAPA.