Pesquisa da UFSCar sobre novos materiais para impressão 3D é premiada
Linha de pesquisa é única no Brasil e pioneira também em termos mundiais
Pesquisas realizadas no Departamento de Engenharia de Materiais (DEMa) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em parceria com instituições alemãs, resultaram em artigo premiado com o “2017 Best Paper Award” pelo periódico científico “Shape Memory and Superelasticity”, principal publicação mundial na área de ligas com memória de forma e superelasticidade. O prêmio será formalmente entregue em maio de 2019, na Conferência Internacional em Tecnologias de Memória de Forma e Superelasticidade (SMST), que acontece na Alemanha. Dentre os autores do trabalho premiado estão Piter Gargarella, docente do DEMa, e Jonadabe Martins dos Santos, mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais (PPGCEM) da UFSCar.
O artigo, intitulado “Properties of Cu-Based Shape-Memory Alloys Prepared by Selective Laser Melting”, integra um conjunto de esforços voltados ao desenvolvimento de novas ligas metálicas com memória de forma, mais baratas do que as disponíveis atualmente e, também, apropriadas ao processo de manufatura aditiva ou, como é popularmente conhecido, impressão 3D. No artigo, especificamente, é relatado um primeiro passo dessa pesquisa, que é a otimização de parâmetros para que o processo resulte em peças com determinadas características desejadas, como, por exemplo, geometria complexa com paredes finas e alta densidade (baixa porosidade). “Atualmente, cerca de 95% das aplicações com ligas com memória de forma utilizam ligas de titânio e níquel, muito caras e difíceis de fabricar pelo fato do titânio reagir muito facilmente com o oxigênio, exigindo fornos especiais e ambiente de vácuo. Por sua vez, as ligas com as quais a gente vem trabalhando, a base de cobre, podem ser fundidas ao ar livre”, explica Gargarella. “Já em relação à manufatura aditiva de peças metálicas, o desafio é o desenvolvimento de materiais mais adequados ao processo, que tem várias particularidades, como a alta taxa de resfriamento e os vários ciclos de aquecimento e resfriamento, cada vez que uma camada de pó metálico é fundida. A maioria dos materiais utilizados atualmente não foi desenvolvido para esse processo, o que tem levado ao aparecimento de diversos defeitos, entre eles trincas, porosidade e empenamento e, assim, limitado a utilização da manufatura aditiva. Por isso, a procura por novos materiais, metálicos, cerâmicos e poliméricos, é muito grande”, registra.
O efeito de memória de forma faz com que um material metálico deformado em temperatura ambiente recupere sua forma inicial quando aquecido (ou quando submetido a uma mudança de sentido de campo magnético, em alguns casos). Um exemplo de fácil visualização é o de uma mola que, deformada em temperatura ambiente, recupera a forma de mola quando imersa em água quente. Esse efeito está relacionado à composição das ligas metálicas mas, também, à geometria das peças produzidas. “A manufatura aditiva permite a construção de peças com estruturas muito complexas, impossíveis de serem obtidas pelos métodos tradicionais. E isso interfere na recuperação da forma, não só pelo efeito de memória de forma, mas também pela superelasticidade, que é a habilidade em apresentar uma elevada deformação recuperável (maior que 5%) após aplicação de carga”, acrescenta Gargarella. “Foi a primeira vez que um grupo empregou a manufatura aditiva para essas ligas a base de cobre, e eu acredito que isto tenha resultado no grande interesse pelo artigo. Essas ligas são pouco estudadas, ainda há um grande potencial a ser explorado, e o nosso grupo já trabalha com esses materiais há bastante tempo”, conclui.
Algumas aplicações das ligas com memória de forma estão nas áreas odontológica – por exemplo, nos fios dos aparelhos, esticados fora do corpo, que diminuem de tamanho quando colocados na boca, tracionando os dentes -, médica – em dispositivos como stents, que na temperatura corporal expandem, aumentando assim o calibre da veia – e da aviação, além de inúmeras peças (sensores e atuadores) internas aos mais diversos equipamentos. “Aqui no Departamento estamos criando uma nova linha de pesquisa, de desenvolvimento de materiais para manufatura aditiva, não só ligas metálicas com memória de forma, mas também outros materiais metálicos, cerâmicos e poliméricos, junto com os professores Murilo Camuri Crovace e Lidiane Cristina Costa. No Brasil, é o único grupo pesquisando especificamente os materiais”, conta Gargarella. O pesquisador registra que projetos recentemente aprovados permitirão a compra dos equipamentos não só para a impressão 3D – que, antes, era realizada nos laboratórios parceiros fora do País -, mas também para a atomização do metal, ou seja, para a produção da matéria-prima do processo, o pó metálico. “Com isso, seremos um dos únicos grupos do mundo com capacidade de realizar o círculo completo, produzindo a matéria-prima, testando o processo de impressão e, depois, realizando os ajustes identificados como necessários na composição da liga. As máquinas são caras, e só conseguimos aprovar os projetos devido à nossa interação, como jovens pesquisadores, com os pesquisadores seniores do DEMa, o que tem funcionado muito bem no Departamento”, completa o pesquisador.
O artigo premiado pode ser acessado gratuitamente no site do periódico, a partir do link http://bit.ly/2rhvYM7. Além dos pesquisadores da UFSCar, três outros autores são alemães – Simon Pauly, Tobias Gustmann e Uta Kühn, do IFW Dresden (www.ifw-dresden.de) -, e o trabalho conta também com a autoria de Jan Van Humbeeck, principal referência mundial em ligas com memória de forma, da Universidade Católica de Leuven (KU Leuven) (www.kuleuven.be), Bélgica. A pesquisa integra projeto de colaboração entre os pesquisadores brasileiros e a instituição alemã, financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e pela Sociedade Alemã de Amparo à Pesquisa (DFG), no âmbito da Bragecrim (Iniciativa Brasil-Alemanha para Pesquisa Colaborativa em Tecnologia de Manufatura).