ESG Summit: bioeconomia e energia renovável podem inserir o Brasil na tendência de nearshoring
O encontro, mediado por Rodrigo Caetano, editor de ESG da EXAME, reuniu Estevan Sartorelli, co-fundador e co-CEO da Dengo Chocolates, Velma Gregório, CEO e fundadora da ÓGUI, e Ricardo Assumpção, sócio da EY e líder de ESG para a América Latina, que debateram o papel que o Brasil pode assumir em um momento em que crescer o interesse pelo nearshoring.
Depois da pandemia, uma das mudanças globais vistas na economia, diante de tantas rupturas no fornecimento de suprimentos, o tema do nearshoring, ou seja, trazer para perto do negócio a cadeia de fornecedores, optando-se pela produção local.
No caso da Dengo Chocolates, o negócio nasceu com a estratégia de ter a figura dos fornecedores locais da produção. No entanto, explica Estevan Sartorelli, co-fundador e co-CEO, no caso da fabricante de chocolates, a definição abrange fornecedores que tenham proximidade geográfica.
“Não precisamos ser especialistas em sustentabilidade para entender que cadeias econômicas produtivas próximas geram menor impacto ambiental e diminuem riscos, principal neste período da história geopolítica que, por guerra ou por mudanças climáticas, está sendo tão impactada”, resume o fundador da Dengo.
Atualmente, três quartos do cacau produzido no mundo vêm da África. Já o Brasil está perto de alcançar a autossuficiência no seu consumo interno. A escala atingida pelo país ajudou na decisão da empresa de apostar no cacau nacional, produzido na Bahia, no Pará ou outros estados.
Oportunidade
Velma Gregório, CEO e fundadora da ÓGUI, acredita que o nearshoring cria a possibilidade de dar materialidade financeira para o que representava um nicho. Empresas que nasciam com o viés da sustentabilidade já tinham o olhar voltado ao desenvolvimento de fornecedores locais. Mas a necessidade de mitigar riscos na cadeia gerou, segundo a empresária, a oportunidade de gerar valor na produção local.
No entanto, lembra Velma, o Brasil ainda não está tão inserido na estratégia de desenvolvimento de cadeias locais de fornecedores, como acontece, por exemplo, no México, que têm cada vez mais atendido a demandas dos EUA em substituição aos chineses.
“Mas temos uma oportunidade gigantesca com a produção de energias renováveis, aumentando a produção no entorno para reduzir a pegada de carbono de todos os produtos, no mundo inteiro”, avalia a CEO da ÓGUI. A executiva pondera, no entanto, que são movimentos que levam tempo, já que dependem de mudanças, como a preparação das cidades para que haja avanço na infraestrutura, além do investimento em educação.
Regulação
No entanto, há ações mais imediatas, como aprofundamento de acordos comerciais, que deem mais segurança nos contratos, tanto do ponto de vista do Brasil atendendo o mercado internacional quanto outros países na posição de fornecedores para atender demandas locais, inclusive com a possibilidade de acordos de regulação aduaneira para facilitar o processo.
Velma cita ainda o papel das agências de promoção de exportações. “O nearshoring traz a oportunidade de mostrar como o Brasil pode atender a cadeias globais e como o nosso país pode estar inserido na cadeia global da América Latina e Caribe. É uma mega-oportunidade de materialidade financeira”, avalia. Isso porque, segundo ela, se reduz os riscos financeiros, tem mais oportunidades de distribuição de produção, com o viés das mudanças climáticas.
Oportunidade para o Brasil
Ricardo Assumpção, sócio da EY e líder de ESG para a América Latina, concorda com Velma e aposta no nearshoring como uma grande oportunidade para a região. O Brasil, neste contexto, tem um papel relevante como grande produtor de commodities e de energia renovável. O executivo acredita que esta proximidade da cadeia de fornecedores não deve recuar, já que existe uma demanda por mais transferência e mais controle para uma redução de custo. No entanto, há o desafio de se avançar em acordos comerciais que criem segurança para os negócios, já que nem sempre a geografia consegue aparar arestas.
Outro alerta do sócio da EY é em relação ao papel das mudanças climáticas no avanço do nearshoring. Na sua análise, esta ainda não tem sido uma alavanca no novo papel das cadeias de suprimentos, mas sim os aspectos financeiros.
“As emissões deveriam ser uma parte importante quando falamos em logística, mas é uma parte pouco computada quando se fala de nearshoring”, adverte Assumpção. Diante disso, avalia o executivo da EY, a expectativa é de uma participação crescente do Brasil nos próximos anos nas cadeias regionais de abastecimento, já que o país oferece como uma das suas vantagens o fato de emitir um volume menor de gases de efeito estufa (GEE).
Para uma empresa com o impacto social como a Dengo, que nasceu comprometida com a geração de renda descente para os pequenos e médios produtores de cacau, foi preciso desenvolver um mecanismo de modelo agrícola, com o pagamento de prêmio de preço como transferência de riqueza para que o agricultor possa evoluir na sua renda mensal. No ano passado, a Dengo remunerou mais do que o dobro da cifra paga pelo mercado, segundo Sartorelli, impactando na renda do produtor. “Compromisso local é chave para gerar impacto local”, aponta o empresário.
O nearshoring, em síntese, tem potencial para reduz riscos, custos e as emissões de CO2, além de aumentar o desenvolvimento local. Apesar de ser tratado como um tema importante para os negócios, o papel da cadeia de suprimentos também conta com a participação dos consumidores.
A lógica de adesão ao nearshoring, na análise do CEO da Dengo, passa por uma mudança de hábito também dos consumidores, que muitas vezes aderem à importação de produtos e não se preocupam em fomentar comércios locais, como o mercadinho do bairro. Ou seja, as escolhas pessoais, diz, também têm um papel social importante, não só o das empresas.
Desafios
A equação para colocar em práticas na cadeia global de suprimentos que levem em consideração aspectos como custo e o compromisso social traz sinais de complexidade. O sócio da EY acredita que são tantos os ganhos que vale a pena a aposta. “Nas reuniões globais de planejamentos ouvimos sobre os grandes clientes de empresas de bens de consumo se reorganizando. Mas começo a olhar o Brasil como um potente polo com o seu potencial ainda não descoberto”, afirma. Por exemplo, por meio da organização de cadeias produtivas desenvolvidas nos biomas locais. Na sua opinião, o país precisa deixar casos para modelos bem-sucedidos.
No ano passado, foi lançado pela EY o primeiro hub global, batizado de EY Nature Hub, para entender como é possível criar cadeias de suprimentos sustentáveis, resilientes e em escala, que usem produtos da bioeconomia brasileira. Hoje, de cerca de 350 produtos com esta origem, o país utiliza 12 a 13.
“Sabemos que a conta precisa fechar, mas isso tem de acontecer com um efeito positivo. Temos uma janela importante até a COP30 na atração de capital para o Brasil, não só pela posição geográfica, mas também pelo valor socioambiental criado”, aponta Assumpção.
Summit
O Summit ESG da Exame é considerado o maior evento ESG da imprensa nacional e reúne debates que refletem a cobertura constante da Exame sobre os principais temas sociais e ambientais de interesse global.
Neste ano, serão realizados 21 painéis, organizados em oito blocos temáticos. Os temas abordados serão: Cadeias de Produção Sustentáveis, Inclusão e Empoderamento Econômico, Transição para uma Economia de Baixo Carbono, Financiando a Transição, Bioeconomia e Agro Sustentável, Soluções para a Transição Energética, Economia Circular e Adaptação e Transição Justa.
A cada semana, dois blocos serão veiculados, sempre às terças e quintas. Cadastre-se aqui para conhecer os detalhes da programação
Além disso, em junho, a Exame publica o Melhores do ESG, principal guia de sustentabilidade do Brasil, realizado há mais de duas décadas. A premiação das empresas que mais contribuíram para o desenvolvimento sustentável do país está marcada para o dia 17 de junho, celebrando organizações que se destacam não apenas pelo lucro, mas também pelo compromisso com o desenvolvimento social e a preservação ambiental.
Matéria – Exame, Por Paula Pacheco