Empresas querem ‘traduzir’ agricultura de precisão para pessoas de baixa escolaridade
Colocar uma máquina de milhares de reais na mão de um tratorista tem se tornado um dilema para os gestores de propriedades rurais. Na realidade brasileira, muitos dos operadores de maquinário têm baixa escolaridade, fator que complica a compreensão de termos e da própria atividade na era da inteligência artificial. Foi a partir deste desafio que surgiu a empresa Já Entendi Agro, cuja metodologia de educação foi desenvolvida por Gladys Mariotto.
Após uma experiência extensa na área educacional no Japão, a empresária voltou ao Brasil e começou a focar o negócio, primeiramente, em outros setores. Em 2020, ela se deparou com a oportunidade de atender a uma demanda do agronegócio: traduzir o funcionamento das máquinas agrícolas para os operadores das fazendas. De acordo com ela, entre 70% e 74% do público atendido por ela, nos cursos de agro, é formado por analfabetos funcionais.
“Ele [o funcionário] não precisa fazer um curso de agronomia, mas tem que entender por que aplicar aquela fórmula no solo e quais os riscos de não aplicar. Esse cálculo, até pouco tempo atrás, não fazia diferença. Agora, com a agricultura de precisão, isso tem mais importância”, afirma Mariotto.
Por meio de histórias e materiais ilustrativos, os cursos ensinam como evitar os incêndios em tratores, evitar desperdício de insumos, aplicar metodologias de sustentabilidade, entre outros processos relevantes em uma empresa rural. Também é considerada a questão da conectividade, por isso os cursos não necessitam de internet e e-mail. Ao final, há um certificado.
“A Bayer tem um alto nível tecnológico e trouxe essa demanda sobre os operadores de máquina. Com a BRF, tivemos uma ação com as cozinheiras de refeitório, que recebem cursos para menor desperdício e aproveitamento integral dos alimentos”, diz a CEO da Já Entendi Agro. As contratações dos cursos, ela esclarece, têm sido feitas por parte da indústria.
Marketing de educação
Para Ivana Amaral, gerente de marketing de engajamento da Climate FieldView — vertente de agricultura digital da Bayer —, a estratégia da empresa de cursos corrobora com o chamado marketing de educação, em que transferência de conhecimento precisa ser palatável para traduzir um conteúdo técnico.
“Termos técnicos e novos, como conceitos agronômicos que não são tão simples de ser compreendidos, e nomenclaturas que envolvem a agricultura digital. Por isso a ideia de trazer o marketing de conteúdo com a educação, criar um stortyteling para envelopar o curso e incluir reconhecimentos, como certificado ou um prêmio”, ela explica.
Ivana Amaral conta que a multinacional alemã tem outros parceiros para atender a necessidade educacional no campo, como cursos para gestores de fazenda e distribuidores. “Hoje em dia, a gente vê muito interesse sobre carbono e NDVI [medida da saúde das plantas], pois é um mercado carente de conhecimento técnico, que quer saber até o detalhe”, diz.
Matéria – EXAME, por Mariana Grilli