Os problemas causados pelo profundo atraso que a Petrobrás está enfrentando na execução das obras da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) do Comperj, que seria a pedra angular da distribuição da produção de gás do pré-sal, virou uma dor de cabeça que não tem remédio para contorná-la. Tecnicamente, a responsabilidade é do consórcio formado pela Chinesa Kerui com a brasileira Método Potencial, mas conceitualmente é da equipe do intocável departamento de licitação da companhia, que vem sucessivamente causando prejuízos incomensuráveis para a Petrobrás. Esta obra mostra a joia da coroa da administração de Roberto Castello Branco, cujo o maior legado foi a troca de nome do Comperj para Polo Gaslub. Desde da escolha do consórcio vencedor por um preço abaixo do que a própria Petrobrás tinha ajustado, já se sabia que a obra teria problemas. O próprio Petronotícias alertou para isso. O estrago agora não tem solução possível. Duas mil pessoas perderam o emprego, dezenas de fornecedores brasileiros e internacionais fazem fila na porta para receber seus fornecimentos e dão de cara numa empresa que parece quebrada. No estilo Devo não pago, nego enquanto puder. Os custos da obra, que foi orçada pela Kerui em R$ 1,94 bilhão, já passou dos R$ 3 bilhões e está longe de terminar.
Foi na administração do ex-presidente Roberto Castello Branco que este problema eclodiu e ganhou corpo e, além das dificuldades com os preços dos combustíveis, o atraso na obra da UPGN parece ter sido uma das razões para que ele tenha sido demitido em público pelo Presidente Jair Bolsonaro. Sem nenhum pudor ou envergonhado, decidiu agarrar-se ao cargo até o último dia do seu mandato. Mesmo trabalhando de casa, enquanto os funcionários se desdobravam nas plataformas de produção, queria comandar a companhia. Neste período, os problemas da empresa só se agravaram. Como presidente da companhia, possivelmente, ele tenha sido uma das maiores decepções nos quase 70 anos de história da estatal. Agora, como presidente do Conselho de Administração de uma petroleira, que já era eficiente e com boas perspectivas no mercado, a 3R Petroleum, compromete o cargo e a própria companhia, jogando farpas rancorosas em sucessivas entrevistas para jornais que compõem o consórcio de oposição ao governo. No fundo, ele está colocando a 3R Petroleum, comandada pelo competente Ricardo Savini, em rota de colisão frontal com o governo federal. Na verdade, seria mais ético desligar-se da 3R Petroleum, se quiser desafiar o Presidente da República com objetivo de desgastá-lo na corrida eleitoral.
Em nota, a estatal disse: “A Petrobrás ratifica que o desligamento de colaboradores nas obras do Polo Gaslub, em Itaboraí, Rio de Janeiro, é uma decisão unilateral da empresa SPE Kerui-Método. A Petrobrás informa que está em dia com os seus compromissos com a referida empresa e o contrato permanece em execução. Adicionalmente, esclarece que as obrigações de honrar com verbas indenizatórias aos trabalhadores demitidos é do empregador, no caso, a empresa SPE Kerui-Método, cabendo à Petrobrás a adoção de ações contratuais e até judiciais caso isso não ocorra. No momento, a companhia está avaliando ações pertinentes a fim de minimizar eventuais impactos à realização da obra.”
Quando começou a pandemia com reflexos diretos no Brasil, no primeiro trimestre de 2020, a obra já estava atrasada e havia muitas dificuldades de pagamentos aos fornecedores, que entregavam seus produtos encomendados e não recebiam. A Petrobrás, neste caso, estava cumprindo o seu cronograma de pagamentos, conforme algumas reportagens que o Petronotícias publicou na época. O consórcio se agarrou na decisão da Petrobrás de mandar reduzir em 70% o efetivo de trabalhadores no Comperj.
Para o consórcio, os desequilíbrios financeiros começaram a partir daí, com a redução e demissão de funcionários. As empresas negociaram com a Petrobrás para discutir esses valores, depois buscar os recursos de uma arbitragem, sem sucesso. A empresa conseguiu gerar cerca de R$ 700 milhões em aditivos ao contrato, mas nem assim pagou aos seus fornecedores, como a Metasa, do Rio Grande do Sul, por exemplo, uma das maiores e mais tradicionais empresas do país, fornecedora de estrutura metálica. Até hoje, está sem receber. A conta do consórcio é alta com a empresa do sul do país. Mas a Metasa está numa lista com muitas outras empresas. O problema social que essas interrupções nos pagamentos provocaram na cadeia de fornecedores foi e ainda é muito grave. Um grande impacto. A Petrobrás, por sua vez, reclamava da performance da obra.
Para lembrar, em maio de 2021, o Petronotícias teve acesso ao teor da carta enviada pelo consórcio às empresas fornecedoras e reproduzimos novamente agora, sabendo que os problemas não foram resolvidos. O documento foi assinado pelo então Gerente de Suprimentos Sergio Mata:
“Primeiramente, importante ressaltar que a KERUI MÉTODO foi contratada pela Petróleo Brasileiro S.A. – PETROBRÁS (Contrato n° 0804.0106414.17.2) para execução, sob regime de empreitada por preço global, do remanescente de obras das Unidades de Processamento de Gás Natural, doravante denominado como “Projeto UPGN”.
A empresa vem executando os serviços na forma estabelecida contratualmente com a PETROBRÁS, mas foi negativamente surpreendida pela crise gerada pela pandemia de coronavírus (COVID-19). Nesse sentido, vale ressaltar que o primeiro caso de coronavírus foi identificado no início de dezembro de 2019, na China, espalhando-se rapidamente pela Ásia e, em seguida, pelo mundo. Diante da sua alta capacidade de contágio, a China decretou “lockdown” em janeiro de 2020, suspendendo a produção de equipamentos que estavam na fase final de fabricação, ocasionando atraso significativo na entrega de itens que são essenciais para o Projeto UPGN.
Já no dia 11 de março de 2020 a Organização Mundial de Saúde – OMS elevou os alertas de importância internacional com a Declaração de Pandemia decorrente do novo coronavírus. A pandemia de coronavírus também postergou o embarque de equipamentos fabricados na Tailândia, pois os navios foram impedidos de atender a programação de embarque em razão das restrições sanitárias e implementação de rígidos protocolos de acesso.
Com reflexo dos problemas trazidos pela pandemia de coronavírus ao mundo, no dia 20 de março de 2020 houve o reconhecimento da ocorrência de calamidade pública pelo Senado Federal (Decreto Legislativo nº 06/2020), situação que vem trazendo fortes impactos negativos ao Brasil, especialmente no que tange aos aspectos social e econômico. Com o objetivo de conter a proliferação do coronavírus, a Secretaria Municipal de Saúde de Itaboraí/RJ, por intermédio do Ofício SMS/SSVS/nº 021-2020, de 23 de março de 2020 determinou a interrupção de pelo menos 70% (setenta por cento) das atividades de campo da força de trabalho das empresas que atuam no Município.”
Para lembrar novamente, a unidade de processamento de gás do Comperj será a maior do país, com capacidade de processamento de até 21 milhões de m³ por dia. O projeto era para ampliar a infraestrutura de escoamento e o processamento de gás do pré-sal da companhia, que passará de 23 milhões para 44 milhões de m³ por dia. Além de gerar energia, o gás seria utilizado em veículos e indústrias. Contribuiria também para reduzir a necessidade de importação de gás natural, assim como viabilizar o aumento da produção de óleo do pré-sal, uma vez que aumentará o processamento de gás associado ao petróleo produzido na região.
Fonte: Petronotícias