A resolução de massas na espectrometria de massas
Por Oscar Vega Bustillos*
O estado da arte na instrumentação analítica é observado na espectrometria de massas de alta resolução, a qual é capaz de separar fragmentos de massas na quarta ou quinta casa decimal denominados “massa exata”. Os instrumentos anteriores estavam limitados a unidades de “massa inteira”, onde a resolução de um espectrômetro de massas é definida como a razão entre uma determinada massa e a diferença entre massas subseqüentes, isto é, M/(M 2 – M 1 ), matematicamente descrito como M/ΔM, medida estatística do pico de massa da gaussiana: Largura total na metade do máximo (Full Width at Half Maximum – FWHM). A Figura 1a apresenta o espectro de massas de uma mistura de analitos, analisada com um instrumento com resolução 1.000. Observa-se que somente um pico é observado. A Figura 1b apresenta a mesma amostra, mas com um instrumento com resolução 5.000. Maior número de analitos são detectados no intervalo de massas de m/z 1,060 a 1,066. Por exemplo, nas medições de massa nominal inteira, não seria possível distinguir entre os íons protonados da Lisina ou da Glutamina com razão m/z 147,1128 e 147,0764, respectivamente. No entanto, um espectrômetro de massa com um poder de resolução de mais 10.000 seria facilmente capazes de distinguir esses dois íons. Obviamente, quanto maior a resolução do espectrômetro de massas, mais íons espaçados podem ser facilmente analisados. A alta resolução pode ser traduzida como medições de massas mais exatas.
Atualmente, várias opções de analisadores de massas com alta resolução estão disponíveis no mercado. Analisadores de tempo de voo (Time of Flight – TOF) permite atingir facilmente uma resolução de 20.000 e até maiores, chegando a 60.000 para certas máquinas TOF com defletores iônicos. Ainda com maior resolução, o “Orbitrap” e o espectrômetro de massas por ressonância de cíclotron iónica por transformada de Fourier (Fourier Transform Ion Cyclotron Mass Spectrometry – FTICR) pode alcançar resoluções de 100.000 e até muito mais altas para certas configurações, mas à um custo de velocidade de varredura. O espectrômetro de massas “Orbitrap” foi melhorado desde o seu início, em termos de velocidade de varredura e sensibilidade, até se tornar um instrumento mais rotineiro, principalmente no caso da versão de bancada. O desafio de construir novos espectrômetros de massas com alta resolução teve início em meados do século XX. Certamente graças a ciência de novos materiais e novos sistemas de focalização, resolução de até 10.000 foram atingidas. Em 1955, W.C. Wiley e I.H. McLaren desenvolveram o espectrômetro de massas TOF, mas só em 1973, B.A. Mamyrin inventou o refletor de íons, tornando o TOF um analisador de alta resolução. Historicamente, vários métodos foram desenvolvidos no espectrômetro de massas para melhorar a resolução de massas. Por exemplo, métodos para melhorar a focalização dos íons dentro do espectrômetro de massas, assim como também métodos para produzir uma maior dispersão das massas iônicas e a injeção de íons positivos a partir da fonte de íons no interior de campos eletro-magnéticos homogêneos e transversais à trajetória dos íons. Em 1938, J.A. Hipple e W. Bleakney utilizaram pela primeira vez este princípio na construção de um espectrômetro de massas com base na curva cicloide como caminho iônico, embora já se soubesse que o movimento de um íon num plano perpendicular ao do campo magnético deveria seguir um caminho de “trocoide”. Se um campo magnético homogêneo é utilizado para defletir os íons através dos 360 o , o detector de íons deveria estar na mesma localização que a fonte de íons. Adicionando um campo elétrico homogêneo à 90 o do campo magnético será fornecido aos íons um movimento transversal linear como também um movimento circular graças ao campo magnético. O resultado é um caminho de “trocoide” dos íons, desta forma possibilita separar a fonte de íons e o detector de íons (Figura 2). No ano de 1959, H.W. Voorhies e colaboradores utilizaram um espectrômetro de massas trocoide, aplicaram 3.200 Volts entre as placas do sistema obtendo um campo elétrico da ordem de 150 Volts/cm, além de aplicar simultaneamente um campo magnético de 10.000 Gauss, obtendo uma ótima resolução de 2.500. Por meio deste espectrômetro de massas, Voorhies e colaboradores conseguiram separar e analisar o famoso doblete iônico, N 2 + e CO + , isto é, Nitrogênio molecular com massa 28,0056 e Monóxido de Carbono com massa 27,9949 que são detectados como isômeros com massas m/z 28 para um espectrômetro com resolução de uma unidade de massa atômica (u.m.a.). Utilizando o espectrômetro trocoide com resolução de M/ΔM = 2.500, eles conseguiram separar e analisar o famoso doblete Nitrogênio / Monóxido de carbono, graças à utilização da curva cicloide, demonstrando a importância da geometria no caminho iônico na espectrometria de massas. Os espectros de massas da análise do referido doblete estão apresentados na Figura 3. No espectrômetro trocoide onde é considerada a curva cicloide prolata é observado para uma separação D = 2πa, na direção x sob influencia dos campos magnético e elétrico dado pela seguinte equação,
onde, E é a intensidade do campo elétrico, H é a intensidade do campo magnético, v 0 é a velocidade inicial que o íon entra no campo transversal elétrico magnético (esta velocidade é determinada pela massa do íon e pelo potencial V de aceleração de injeção dentro do campo). A diferença (90 0 – Φ) é o ângulo entre o campo elétrico e o feixe de íons positivos ingressantes, segundo a ilustração da Figura 4. O ângulo de ingresso dos íons a partir da fonte de íons para dentro do campo elétrico é de aproximadamente 90 0 . O ângulo Φ é ilustrado na curva da cicloide prolata, isto é b > a, onde b = 2a (Figura 4) na qual descreve o percurso dos íons dentro de um espectrômetro de massas trocoide. O espectrômetro de massas trocoide pode operar tanto para íons positivos como negativos, mas este tipo de espectrômetro requer um campo elétrico e magnético uniforme que demanda uma área considerável dentro deu m laboratório, sendo esta uma desvantagem. Certamente, os futuros espectrometristas de massas terão à sua disposição, mais instrumentos com alta resolução. Obtendo massas exatas nos seus espectros para elucidar as pesquisas em desenvolvimento. Esta conquista da alta resolução foi obtida graças aos criativos pesquisadores da espectrometria de massas, tal como J.J. Thomson obteve a massa do elétron e massas isotópicas dos elementos da tabela periódica por meio da leitura das parábolas desenhadas em placas fotográficas.
Figura 1: Espectros de massas de uma mesma mistura de analitos; a) Obtido com um analisador com Resolução 1.000 e b) obtido com outro analisador com Resolução 5.000.
Figura 2: Trajetória dos íons num espectrômetro de massas “Trocoide”, onde E e B representam o campo elétrico e magnético respectivamente.
Figura 3: Espectros de massas da análise da mistura gasosa CO e N 2 . O espectro “A” apresenta análise realizada com espectrômetro de massas com resolução de massa inteira. Os íons; CO + (m/z 28) e N 2 + (m/z 28) não podem ser separados. O pico 28 é conhecido como o doblete CO/N 2 . O espectro “B” apresenta análise realizada com espectrômetro de massas Trocoide de alta resolução onde os íons CO + (m/z 27,99) e N 2 + (m/z 28,00) foram separados.
Figura 4: Curva cicloide prolata (b > a), onde b = 2a. Ângulo Φ de ingresso dos íons dentro do campo elétrico do espectrômetro de massas “Trocoide”.
Referências bibliográficas
1) J.D. Pleil and K.K. Isaacs. “High resolution mass spectrometry”. J. Breath Res. 10(1)012001. (2016).
2) L. Sleno. “The use of mass defect in modern mass spectrometry”. J. of Mass Spectrometry. (2012).
3) O.Vega e A.Sassine “A magia da curva cicloide”. Scortecci. (2011).
*Oscar Vega Bustillos
Pesquisador do Centro de Química e Meio Ambiente CQMA do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares IPEN/CNEN-SP
55 11 28105656
ovega@ipen.br
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