Riscos Biológicos Associados a Cosméticos
Autores: Jonathas Xavier Pereira; Thaís Canuto Pereira.
Resumo – O uso de produtos cosméticos está aumentando em todo o mundo e uma variedade de compostos químicos utilizados na fabricação desses produtos cresce ao mesmo tempo. Dessa forma, também aumentam o risco de intoxicação, processos alérgicos, exposição química prolongada, efeitos colaterais e uso indiscriminado. O presente trabalho tem como objetivo destacar os riscos biológicos que os cosméticos podem representar para a saúde humana contra as substâncias tóxicas utilizadas em sua formulação. Este trabalho é uma revisão integrativa da literatura estruturada de acordo com a metodologia descrita por Whittemore, R. e Knafl, K., 2005. O presente trabalho relaciona as principais substâncias químicas tóxicas presentes em produtos cosméticos às possíveis complicações de saúde relatadas na literatura científica. Atualmente, as indústrias cosméticas têm aumentado o uso de compostos com ação conservante, surfactante, fragrâncias, corantes, etc. na formulação de produtos cosméticos. Tais substâncias potencializam a qualidade, propriedade e prazo de validade dos cosméticos, mas, por outro lado, muitas dessas substâncias são tóxicas para o corpo humano, apresentando riscos à saúde que variam de uma reação simples de hipersensibilidade leve a um processo anafilático ou até uma intoxicação letal. Assim, o uso indiscriminado de cosméticos pode se apresentar como uma questão emergente de saúde pública. Diante do exposto, este trabalho busca incentivar melhorias na busca de novas metodologias para controle de qualidade na produção e consumo de produtos cosméticos em todo o mundo.
Palavras-chave: cosméticos, riscos biológicos, toxicidade, controle de qualidade, efeitos adversos.
- Introdução
Historicamente, os cosméticos começaram a ser usados há 6.000 anos e seu uso se espalhou pelo mundo. Tais produtos tinham o objetivo de adornar e perfumar o corpo, de modo a não alterar a estrutura e a função da pele. No Egito antigo, os registros apontam para o uso de cosméticos que contêm pigmentos pretos (Kohl) com chumbo aplicados na região dos olhos. O chumbo, por sua vez, quando em contato com a pele, libera óxido nítrico gasoso capaz de ativar o sistema imunológico por vasodilatação e ativação de macrófagos com características citotóxicas.
Atualmente, cosméticos e produtos para cuidados com a pele são consumidos em todo o mundo, com uso frequente, aumentando a exposição do corpo humano aos vários compostos químicos que compõem suas fórmulas. Estipular a incidência de efeitos colaterais causados por cosméticos é bastante difícil, porque os usuários com efeitos colaterais fracos geralmente não procuram atendimento médico.
Os efeitos colaterais derivados do uso de cosméticos apresentam riscos à saúde, principalmente devido à exposição a inúmeras substâncias químicas. Suas consequências podem variar de uma reação simples de hipersensibilidade leve a um processo anafilático ou até uma intoxicação letal.
- a) O início das complicações de saúde devido ao uso de cosméticos.
O uso de cosméticos pigmentados à base de chumbo usados pelos egípcios é caracterizado como a evidência mais antiga do uso de cosméticos e suas complicações. Posteriormente, apareceram rouges e batons cuja coloração avermelhada foi atribuída ao sulfeto de mercúrio. Esse composto, quando ingerido por mulheres grávidas, causava aborto espontâneo. Outro composto tóxico capaz de causar danos ao organismo foi o arsênico usado por gregos e romanos em soluções depilatórias químicas.
Com o avanço do conhecimento sobre a fisiologia da pele e seus componentes, as indústrias farmacêuticas passaram a investir em novos princípios ativos e veículos para a produção de cosméticos. Assim, novos testes de controle de qualidade na fabricação desses cosméticos também deveriam ser atualizados para garantir a segurança no uso de tais compostos.
Várias agências reguladoras em todo o mundo se dedicam ao controle e regulamentação de atividades comerciais, segurança e controle de qualidade de cosméticos. Embora existam regras e controle de qualidade testes a serem seguidos para a fabricação de um cosmético, esses mecanismos regulatórios não são totalmente eficazes, pois os efeitos adversos ainda persistem na população de consumidores.
- b) Os riscos biológicos no uso de cosméticos e a saúde pública.
Diante do uso de produtos cosméticos e da maior exposição aos compostos das fórmulas por um longo tempo e frequência, os efeitos colaterais desses produtos se tornam mais frequentes na população em todo o mundo. Mulheres e homens em todo o mundo usam grande quantidade de produtos cosméticos em busca da juventude eterna, ignorando os prováveis riscos à saúde.
Os ingredientes cosméticos também são poluentes emergentes. Embora seu monitoramento ambiental esteja em um estágio muito inicial, sabe-se que os produtos cosméticos atingem o meio ambiente de várias maneiras, muitas vezes através da água, apresentando riscos biológicos aos ecossistemas e humanos.
Assim, em relação à saúde pública, o termo “cosmetovigilância” passou a representar um tipo de estratégia em saúde onde o objetivo é priorizar a segurança do produto cosmético para fins comerciais. Essa vigilância é muito importante para controlar ingredientes potencialmente perigosos e, portanto, pode tranquilizar nossa mente quanto aos produtos colocados no mercado.
As restrições ao uso de alguns ingredientes cosméticos são estipuladas por várias agências de vigilância em todo o mundo, permitindo que qualquer ingrediente que não conste da lista de restrições, seja permitido. Assim, como a indústria é bastante criativa e está sempre buscando melhorar sua produção, constantemente novos ingredientes são produzidos e utilizados na confecção de cosméticos por não constarem na lista de restrições das agências reguladoras. Esses ingredientes são novos alérgenos em potencial. Ao contrário dos medicamentos, não existe um órgão específico para avaliar a segurança de produtos cosméticos, nenhuma autorização de comercialização com requisitos específicos, nenhuma avaliação da relação risco-benefício e nenhuma garantia de constância de um lote para outro.
Os riscos à saúde associados ao uso de produtos cosméticos se tornam atualmente um problema emergente de saúde pública, onde cerca de 12% dos usuários na população em geral experimentaram efeitos indesejáveis com um ou mais produtos cosméticos nos últimos nove anos.
- Metodologia
Este estudo é uma revisão integrativa da literatura com base no modelo proposto por Whittemore e Knafl, onde visa relacionar aspectos clínicos e toxicológicos no uso de produtos cosméticos. Esta revisão reuniu um total de 32 estudos publicados entre 1998 e 2015, derivado do banco de dados PubMed.
Os artigos científicos seguiram os critérios de inclusão: artigos que contenham os descritores “cosmetics toxicity”; “cosmetic intoxication”; “cosmetic risk”; “cosmetic danger”; “cosmetic side effects”.
Os artigos científicos seguiram os seguintes critérios de exclusão: foram excluídos os artigos relacionados à cirurgia estética ou que não se relacionam a produtos cosméticos. A seleção de artigos científicos incluiu revisões e artigos originais com abordagem clínica e toxicológica. Essa metodologia visa relacionar as principais substâncias químicas tóxicas presentes nos produtos cosméticos com as possíveis complicações de saúde relatadas na literatura científica. Por meio deste estudo integrativo, a correlação clínico-toxicológica se torna um instrumento valioso para esclarecer e entender os efeitos colaterais do uso de cosméticos, chamando a atenção para o uso negligenciado desses produtos e destacando os riscos à saúde associados.
III. Substâncias com potencial tóxico na formulação de cosméticos
Diante das inovações tecnológicas na indústria de cosméticos, muitos produtos químicos foram adicionados como aditivos químicos para aumentar seu desempenho, eficácia e viabilidade. Alguns exemplos desses aditivos químicos são: Diazolidinil Ureia, Dioxano, Formaldeído e Paraformaldeído, Imidazolidinil Ureia, metais pesados, Metilcloroisotiazolinona-metilisotiazolinona (MCI-MI), Metildibromoglutaronitrila-fenoxietanol (MDBGN-Quaternal, PE), Parabenos e outros.
- a) Diazolidinil Ureia
É um aditivo usado desde 1982 na fabricação de produtos para cuidados pessoais, como produtos infantis, maquiagem para olhos e rosto, produtos de cuidados com a pele, cabelos e unhas.
A exposição a esse composto é capaz de causar dermatite alérgica de contato, além de ser caracterizada como um agente mutagênico e carcinogênico, pois é capaz de liberar formaldeído, um fixador e conservante que será discutido mais adiante.
- b) Dioxano
O 1,4-dioxano é um éter com uma função emulsificante, detergente e solvente comumente encontrada em produtos como shampoo, creme dental e enxaguatório bucal.
Embora este composto não esteja listado como um componente cosmético, esta substância é um contaminante na etapa de etoxilação, criando outros ingredientes como polietilenoglicol, polietileno e polioxietileno. Assim, altos níveis desse contaminante podem ser observados em produtos cosméticos, sendo essa substância química um potente carcinógeno, capaz de desencadear câncer de mama, pele e fígado.
- c) Formaldeído e Paraformaldeído
O formaldeído e o paraformaldeído são conservantes tóxicos, sendo o paraformaldeído um polímero derivado do formaldeído.
O formaldeído possui características moleculares que resultam em um agente de grande risco potencial para o câncer. Estudos clínicos mostram que 13% de uma amostra de 957 participantes apresentaram dermatite alérgica de contato causada por formaldeído, que é a segunda maior causa de dermatite de contato provenientes de produtos cosméticos.
Em um estudo realizado por Agner et al., 1999, 57 pacientes foram avaliados quanto à sua exposição ao formaldeído. Para essa análise, os participantes foram convidados a trazer diariamente os principais cosméticos usados por eles. No total, 409 produtos foram catalogados e, dentre eles, 103 tinham formaldeído em suas composições.
- d) Imidazolidinil ureia
A imidazolidinil ureia é um conservante usado em produtos cosméticos que também tem a propriedade de liberar formaldeído como consequência de sua degradação, como a Diazolidinil ureia.
Concentrações de 0,01% a 1% de imidazolidinil ureia às 24 horas em contato com uma cultura de células do sangue periférico humano foram consideradas doses moderadamente citotóxicas. Em concentrações de 0,1% a 0,5%, o mesmo efeito foi observado em apenas 3 horas.
Os ensaios clínicos apontam para a imidazolidinil ureia como agente causador de alergias à dermatite de contato.
- e) Metais pesados
Um grupo de substâncias perigosas na fabricação de cosméticos são os metais pesados tóxicos, como chumbo (Pb), cádmio (Cd), níquel (Ni), arsênico (As) e mercúrio (Hg). Alguns cosméticos podem conter alumínio (Al), classificado como metal leve. Como não há uma única regulamentação cosmetológica eficaz em todo o mundo, alguns cosméticos coloridos, produtos para cuidados com o rosto e corpo, cosméticos para cabelos e cosméticos à base de plantas podem conter em sua formulação quantidades relativamente altas desses metais pesados. Esses elementos podem se acumular na pele e órgãos internos, causando efeitos tóxicos que podem ser classificados em tópico (principalmente dermatite de contato) e sistêmico (dermatite alérgica sistêmica).
Alguns metais servem como substâncias pigmentares, por exemplo, o cromo (Cr) usado principalmente para sombras e blushes. Cosméticos pigmentados de cor avermelhada, por exemplo, são comumente contaminados com arsênico (As), chumbo (Pb) e mercúrio (Hg).
O antimônio (Sb) pode causar pneumoconiose, alterações da função pulmonar, bronquite, enfisema, dor abdominal, vômitos, diarréia e úlceras. Este metal é encontrado principalmente em batons, lápis de olhos e pó facial. O arsênico (As) pode causar distúrbios da pele, distúrbios nervosos circulatórios e periféricos, um risco aumentado de câncer de pulmão e um possível aumento no risco do trato gastrointestinal e do câncer do sistema urinário. Este metal é encontrado principalmente em pó de maquiagem e creme para a pele. O cádmio (Cd) pode se acumular nos rins, com possíveis danos. A exposição crônica a baixos níveis de cádmio também pode causar fragilidade óssea e conseqüentes fraturas ósseas. O cádmio é comumente encontrado em cremes para o cabelo, batons e creme para a pele. O cromo (Cr) em seu estado oxidado pode causar alergias de contato. Sua presença em cosméticos está principalmente associada a delineador, lápis de olho, sombra, batom e pó de maquiagem. O cobalto (Co) e o níquel (Ni) podem causar alergias, como dermatites de contato, e esses metais geralmente estão presentes em cosméticos como sombra para os olhos, pintura no rosto, creme para os cabelos e batom. O chumbo (Pb), quando ingerido em grandes quantidades, pode interferir na síntese de hemoglobina e canais de cálcio, cujas funções são importantes para a condução nervosa. O chumbo é encontrado em corantes para cabelos (como acetato de chumbo) e batons, delineador, lápis para os olhos, creme para os cabelos em sua forma inorgânica e pode ser minimamente absorvido pela pele.
- f) Metilcloroisotiazolinona-metilisotiazolinona (MCI-MI)
O MCI-MI é um conservante amplamente utilizado na fabricação de produtos de higiene pessoal, que possui um alto grau de citotoxicidade e é dependente da dose quando testado in vitro, em células cultivadas. Em produtos cosméticos, este composto representa um alérgeno importante e pode causar hipersensibilidade quando há exposição constante a essa substância.
- g) Metildibromoglutaronitrila-fenoxietanol (MDBGN-PE)
O MDBGN-PE também é um conservante usado na fabricação de cosméticos, como, por exemplo, cremes hidratantes. Este composto é o conservante com maior potencial de causar dermatite de contato, apresentando uma incidência média de 14,5% na população.
- h) Parabenos
Os parabenos são ésteres do ácido p-hidroxibenzóico, com substituintes alquil variando de grupos metil a butil ou benzil. Os parabenos também são um grupo de substâncias para fins de preservação. Alguns exemplos desses aditivos químicos são metilparabeno, etilparabeno, propilparabeno, butilparabeno e benzilparabeno. Seu uso também está associado à ação antimicrobiana e é amplamente utilizado na indústria de cosméticos, pois apresenta baixo custo para sua implementação na produção. Metilparabeno e propilparabeno são os mais comumente usados e frequentemente presentes nos produtos cosméticos juntos.
No passado, o uso de parabenos em maior concentração desencadeou reações alérgicas na população. Atualmente, em conjunto com a alteração das resoluções de segurança de cosméticos, produtos de higiene e beleza, o uso de parabenos se tornou muito baixo, sendo utilizado em baixas concentrações, o que reflete em uma redução nos casos positivos relacionados a reações alérgicas ou dermatite de contato.
- i) Ftalato
Os ésteres de ftalato são derivados do ácido ftálico e frequentemente encontrados em produtos como plastificantes, solventes e desnaturantes de álcool. Os compostos de ftalato podem ser encontrados em um número diversificado de cosméticos (esmaltes, loções, produtos para os cabelos, perfumes). As formas mais comumente encontradas são dimetilftalato e dietilftalato.
A exposição a esses componentes pode desencadear distúrbios do desenvolvimento e câncer de mama. Alguns estudos experimentais mostraram que altos níveis de ftalato podem alterar os níveis hormonais e causar defeitos congênitos relacionados aos órgãos genitais em roedores.
- j) Quaternium-15
Quaternium-15 é um alérgeno de contato comum incluído na linha de base europeia. A prevalência de sensibilização por contato é tão baixa quanto 1,2-1,6%, mas pode representar o primeiro evento que leva à reação anafilática sistêmica através da mudança da hipersensibilidade do tipo IV para a hipersensibilidade do tipo I.
- k) Timerosal
O timerosal, um derivado mercúrico do ácido tiosalicílico, é um conservante usado em vários tipos de produtos de consumo, incluindo cosméticos, medicamentos oftalmológicos e otorrinolaringológicos e vacinas.
Devido a um grande número de reações alérgicas e problemas ambientais, seu uso diminuiu nas últimas duas décadas. O timerosal é usado principalmente para a conservação de sombras para os olhos, removedores de maquiagem, máscaras e produtos de limpeza sem sabão.
- l) Outras substâncias
Embora os conservantes mencionados acima sejam as substâncias responsáveis pelos efeitos mais adversos dos cosméticos, outras substâncias têm potencial alergênico, por exemplo:
- Fragrâncias (Myroxylon Pereirae);
- Contaminação química para obter surfactantes (Cocamidopropyl betaine) usados na produção de xampu, sabonete líquido, produtos de limpeza de pele, gel de banho e desodorantes;
- Oxidantes (parafenilenodiamina) muito comuns na composição de corantes capilares;
- Monotioglicolato de glicerila, usado em soluções capilares permanentes (para cabelos ondulados ou cacheados);
- Resina toluenossulfonamida-formaldeído, utilizada na fabricação de vernizes;
- Propilgalato, octilgalato e dodecilgalato são todos antioxidantes usados para evitar a deterioração dos ácidos graxos insaturados que podem causar descoloração e odor, presentes na composição dos cremes e loções cosméticas.
- Possíveis complicações de saúde associadas ao uso de cosméticos
Devido à presença de inúmeros componentes na formulação de produtos cosméticos, esses produtos têm o potencial de causar efeitos colaterais e suas consequências podem variar de uma reação simples de hipersensibilidade leve a um processo anafilático ou até uma intoxicação letal.
Existem muitos tipos de reações adversas causadas por cosméticos. A maioria das reações adversas é irritante, no entanto, hipersensibilidade do tipo IV, urticária de contato, fotosensibilização, distúrbios pigmentares, danos aos cabelos e unhas, paroníquia, erupções acneiformes, foliculite e exacerbação de uma dermatose estabelecida também podem ocorrer. Espera-se que melhorias na segurança, tolerância e compatibilidade entre produtos cosméticos e a pele previnam que os efeitos colaterais aumentem no futuro devido aos aditivos contínuos que buscam intensificar sua atividade biológica e eficácia terapêutica.
As áreas do corpo mais afetadas por reações adversas atribuídas ao uso de cosméticos são a cabeça e o pescoço, e a dermatite irritante é o tipo de complicação mais comum. As complicações de saúde associadas ao uso de produtos cosméticos podem ser:
- a) Reações alérgicas a cosméticos
As reações alérgicas aos cosméticos constituem uma parcela pequena, mas significativa, das complicações associadas ao uso de cosméticos. A dermatite alérgica de contato representa uma verdadeira hipersensibilidade do tipo retardado (tipo IV) que apresenta dermatite eczematosa e compreende aproximadamente 10% a 20% de todos os casos de dermatite de contato. O tipo IV é uma reação de hipersensibilidade mediada por células T, em que células T sensibilizadas circulantes ou residentes são ativadas pelo alérgeno agressor para liberar citocinas pró-inflamatórias. A sensibilização depende de vários fatores, incluindo a composição do produto, uma concentração de componentes alergênicos potenciais, quantidade de produto aplicado, aplicação no local, integridade da barreira cutânea, frequência e duração da aplicação.
Esse cenário clínico pode variar de eritema leve com escala de coceira mínima até placas vesiculares, bolhosas e endurecidas que são intensamente pruriginosas. A sensibilização inicial é necessária para a expansão subsequente de uma reação quando a exposição ocorre novamente.
A urticária de contato alérgica é uma hipersensibilidade imediata que representa uma verdadeira reação alérgica. Como o nome indica, as reações ocorrem em minutos a horas e podem ser limitadas ao local de exposição na pele ou, em casos graves, as reações podem ser generalizadas. A urticária de contato é uma reação mais rara a cosméticos e produtos para cuidados com a pele, que pode ser uma reação imunológica ou não imunológica. O espectro da apresentação clínica varia de prurido e queimação a urticária generalizada e anafilaxia. Em indivíduos altamente alérgicos, nas exposições de mucosas ou grandes exposições, os sintomas de hipersensibilidade imediata podem generalizar e incluir conjuntivite, tosse, bronco constrição, hipotensão, anafilaxia e, ocasionalmente, morte.
- b) Dermatite de contato irritante
Este é o tipo de complicação mais comumente encontrado devido ao uso de cosméticos, especialmente aqueles que contêm metilcloroisotiazolinono-metilisotiazolinona (MCI-MI) em sua formulação. Atualmente, existem mais de 57.000 irritantes descritos em todo o mundo, variando de irritantes fracos ou marginais a ácidos e bases fortemente corrosivos. Então, a maioria dos problemas faciais que surgem com produtos para cuidados com a pele e cosméticos são do tipo de dermatite de contato irritante, manifestando-se como pele eritematosa, ardente e pruriginosa, que pode desenvolver microvesiculação e descamação posterior. A dermatite é caracterizada por dano no estrato córneo sem reação imunológica.
A dermatite irritante facial, que resulta principalmente de cosméticos, se apresenta como pápulas e placas. Outra apresentação comum é uma “dermatite seborreica” com placas escamosas rosa nas bochechas e queixo. Menos comumente, os pacientes podem desenvolver placas urticariformes ou infiltradas.
- c) Dermatite fotoalérgica
Esse tipo de reação alérgica ocorre após o contato com produtos cosméticos e a subsequente exposição à luz. Geralmente, essa reação se apresenta como queimadura solar que pode ser seguida por hiperpigmentação e descamação. Essa reação é formada por substâncias químicas capazes de absorver radiação, principalmente o ultravioleta A, e não possuir mecanismo imunológico definido. Suas manifestações clínicas variam de eritema, edema até vesiculação. A incidência de dermatite fotoalérgica é baixa e é causada principalmente pelas fragrâncias metilcumarina e ambreta de almíscar, agentes antibacterianos e ésteres do ácido para-aminobenzóico como agentes de proteção solar.
A fotoalergia é uma reatividade imunológica alterada, adquirida, incomum, e dependente de um anticorpo imediato ou de uma reação imunológica retardada mediada por células.
- d) Ardência facial
Há um grupo de pacientes que notam ardências ou queimaduras alguns minutos após a aplicação de um cosmético que se intensifica por 5 a 10 minutos e depois desaparece após 15 minutos. Este efeito ocorre sem o paciente apresentar dermatite alérgica de contato ou dermatite irritante de contato com a substância aplicada. Os testes devem ser feitos na pele do paciente antes de usar esses componentes. Geralmente, substâncias como benzeno, fenol, ácido salicílico, resorcinol e ácido fosfórico são as principais causas de ardência na face.
- e) Vermelhidão
A vermelhidão da pele causada por produtos cosméticos, principalmente sabonetes, está associada ao desequilíbrio no pH cutâneo. O sabão moderno é uma mistura de óleo de sebo e nozes, ou os ácidos graxos derivados desses produtos, na proporção de 4:1. Esse fato permite que o pH desses sabonetes seja geralmente alcalinizado (pH 9-10), o que pode gerar vermelhidão na pele, que normalmente tem um pH de 5,2-5,4. Idealmente, esses compostos devem ter pH neutro ou levemente acidificado. Outro motivo pelo qual a vermelhidão pode ocorrer é o uso de hidratantes com maior proporção oleosa, permitindo o aquecimento da pele ao longo do dia.
- Resultados
Atualmente, a inovação, a pesquisa e o desenvolvimento de novos produtos cosméticos aumentaram o uso de compostos com ação conservante, surfactante, fragrâncias, manchas, etc. Essas substâncias aumentam a qualidade, a propriedade e o prazo de validade das formulações cosméticas, mas, por outro lado, muitas dessas substâncias pode ser prejudicial à saúde humana devido à exposição frequente, prolongada e indiscriminada. Existem várias agências em todo o mundo para regular o controle de qualidade, segurança e produção de produtos cosméticos, responsáveis por ajustar os padrões e diretrizes para o uso seguro e saudável de tais produtos pela população, minimizando os riscos à saúde. No entanto, não existe um órgão específico que regule o custo-benefício, a garantia de segurança no uso de substâncias com potencial tóxico quando aplicadas a produtos cosméticos.
Este trabalho analisou várias substâncias com potencial tóxico para o corpo humano, que podem ser encontradas na formulação de vários produtos cosméticos em todo o mundo. Também revisamos as possíveis complicações de saúde relatadas pela literatura científica associadas ao uso de cosméticos e atribuídas a tais substâncias tóxicas. A literatura científica revela que altas quantidades de conservantes químicos, perfumes e emulsificantes usados na fabricação de produtos cosméticos aumentam os efeitos colaterais e os riscos à saúde por meio de princípios químicos e físicos.
Quimicamente, os compostos conservantes geralmente possuem estruturas químicas associadas a anéis aromáticos que geralmente têm potencial tóxico e capacidade de se ligar a elementos metálicos que promovem bioacumulação no corpo. Embora nem todos os compostos que apresentam potencial tóxico tenham seu mecanismo de toxicidade esclarecido na literatura, evidências clínicas obtidas pelos efeitos colaterais após o uso dessas substâncias apontam para o risco à saúde associado ao uso de cosméticos. O risco à saúde associado ao uso de cosméticos pode variar de uma reação simples de hipersensibilidade leve a um processo anafilático ou até uma intoxicação letal.
O câncer também é uma complicação associada ao uso de cosméticos em face de evidências clínicas relatadas na literatura.
Diante da ocorrência de efeitos colaterais, a iminência de complicações associadas ao uso de cosméticos contribui para um problema emergente de saúde pública, conclui-se que o processo de controle de qualidade na fabricação de produtos cosméticos não é totalmente eficaz na prevenção de riscos à saúde associados com o uso de produtos cosméticos.
- Conclusão
Os produtos cosméticos podem apresentar riscos à saúde e efeitos adversos recorrentes são atribuídos às substâncias tóxicas comumente encontradas em suas formulações. Embora as várias estruturas de regulação e controle de qualidade de cosméticos em todo o mundo sejam bastante complexas e abrangentes, elas devem ser mais rigorosas na inclusão de novas substâncias com potencial tóxico na formulação de cosméticos para evitar danos à saúde humana.
Para incentivar melhorias na fabricação, comercialização e uso de produtos cosméticos pela população, é necessário aplicar uma cosmovigilância unificada em todo o mundo. Essa estratégia de saúde pública é um meio genuíno de obter informações sobre a segurança de produtos cosméticos e seus ingredientes, evitando que os riscos associados ao uso de cosméticos se tornem um sério problema de saúde pública.
Agradecimentos
Os autores agradecem à professora Márcia Cury El-Cheikh por incentivar publicações independentes e por estimular a carreira profissional de seus alunos. Os autores agradecem ao Dr. Yuri Cavalcante pela revisão crítica e sugestões para a conclusão deste artigo de revisão. Os autores agradecem a Prof. Mariana Pereira Cabanel e o Prof. Sergio Lisboa Machado pelo apoio e incentivo intelectual. Os autores agradecem à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Referência:
- PEREIRA, J.X.; PEREIRA, T. C. Cosmetics and its Health Risks. GLOBAL JOURNAL OF MEDICAL RESEARCH, v. 18, p. 63-70, 2018.
Artigo presente também na Edição 103 da Revista Analytica.