Extrato de planta nativa é alternativa para controle de doença em abobrinhas
Uma pesquisa desenvolvida pelo doutorando do Instituto de Biociências (IB) da USP Elielson Silveira, em parceria com o Instituto Biológico de São Paulo, mostrou que o extrato da Seguieria langsdorffii, árvore nativa, tem ação antiviral contra o zucchini yellow mosaic virus (ZYMV), o “vírus do mosaico amarelo da abobrinha”. O extrato da planta serviu como meio de controle da doença que é comum em plantações de Cucurbita pepo, a abobrinha de moita, conhecida popularmente como abobrinha italiana, largamente usada na alimentação no Brasil e outros países.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2017, o Brasil produziu 158 mil toneladas de abobrinha. “Ela é cultivada principalmente por pequenos produtores da agricultura familiar e, em geral, é de fácil cultivo. Mas é bastante comprometida por doenças causadas por vírus e, até então, não existia uma maneira de combatê-los”, diz Silveira.
O ZYMV é um vírus é transmitido por pulgões e causa clareamento das nervuras – as “linhas” presentes nas folhas –, bem como a deformação da borda das folhas. Ele representa grande ameaça para as abobrinhas, mas pode afetar outras plantas da mesma família, como as de melancia e do pepino. Ainda assim, seus maiores efeitos são na abobrinha, uma vez que o vírus impede que o fruto se desenvolva adequadamente, apresentando manchas, bolhas e redução ou distorção do tamanho, o que inviabiliza a comercialização.
Silveira encontrou uma solução na Seguieria langsdorfii – conhecida popularmente como limoeiro-do-mato. A ordem à qual ela pertence – Caryophyllales – já é aplicada por conter proteínas de ação antiviral, como é o caso das árvores das espécies brasileiras primavera (Bougainvillea spectabilis) e maravilha (Mirabilis jalapa), utilizadas para controle de vírus em culturas de tomates. Além disso, o uso de plantas nativas mostra a importância da valorização da biodiversidade brasileira.
Produzido por meio de uma mistura de água e folhas da Seguieria langsdorfii, o extrato induz resistência ao vírus por ser rico em proteínas antivirais. “Dá para fazer uma analogia, como se ele [o extrato] fosse uma vacina, que desperta algum mecanismo na abobrinha que faz com que ela consiga combater [o ZYMV], ou pelo menos reduzir os sintomas virais”, explica Silveira. O extrato é aplicado por pulverização e os resultados mostraram até 90% de inibição à infecção na planta.
À esquerda, uma planta de abobrinha infectada apresenta sinais da contaminação por ZYMV, como clareamento das nervuras e deformação da dobra. À direita, uma planta também infectada, mas tratada com o extrato, não apresentou os sintomas – Fotos: Cedida pelo pesquisador
Medida mais ecológica
Para Silveira e sua orientadora de doutorado, a professora do Laboratório de Fitoquímica do IB Deborah Santos, o grande objetivo do trabalho é chegar até o produtor, que pode aplicar o extrato e alcançar o controle biológico de maneira menos agressiva ao ambiente. “A gente vai para um lado sustentável e ambientalmente amigável”, destaca a professora. “Para ele próprio [o produtor] é mais saudável, porque o risco de exposição a algumas substâncias [como as utilizadas em agrotóxicos] é praticamente nulo”, completa.
Atualmente, a medida que o produtor pode tomar para tentar evitar uma contaminação por ZYMV é utilizar variedades resistentes ou tolerantes ao vírus, o que não se mostrou totalmente efetivo. “A gente viu que, quando inoculamos o vírus [na variedade resistente], em certo momento, ela é infectada. Pode ser que demore mais do que as que são suscetíveis, mas ela não é totalmente intolerante”, diz Silveira.
“Os vírus são patógenos muito cruéis com as plantas, porque não existe um ‘viricida’. Em uma cultura infectada por vírus, a única forma de combater é tirar aquela cultura dali”, explica Silveira. Ele ressalta que há poucos estudos feitos sobre a interação vírus e plantas.
Destaque em conferência internacional
O doutorado de Silveira ainda está em andamento. Seu objetivo é seguir avaliando os efeitos do extrato a partir do organismo das abobrinhas, entendendo como ele induz à resistência, os mecanismos envolvidos e quais proteínas fazem parte desse processo. O trabalho conta com a colaboração dos pesquisadores Lígia Maria Lembo Duarte, Maria Amélia Vaz Alexandre e Alexandre Levi Rodrigues Chaves, que desenvolvem estudos sobre propriedades antivirais em plantas no Instituto Biológico de São Paulo, e do professor Tiago Santana Balbuena, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal, onde as análises das proteínas são realizadas.
Em agosto, Silveira apresentou os resultados parciais de seu doutorado na conferência ACS Fall 2024, realizada em Denver, nos Estados Unidos, e organizada pela Sociedade Americana de Química. “Nosso trabalho foi reconhecido como um dos melhores apresentados, e com isso eu recebi um Travel Award, uma espécie de patrocínio para ajudar com as despesas. Foi muito interessante”, relata o pesquisador.
A história até o prêmio tem início no Congresso da Associação Latino-Americana de Ecologia Química, que aconteceu em dezembro de 2023, em Buenos Aires. “Um pesquisador que estava no congresso viu o trabalho, foi falar com ele [Silveira] no painel, e um dos pós-doutorandos desse professor convidou o Elielson a participar do congresso [ACS Fall 2024]”, conta a professora.
O resumo do trabalho recebeu o título Seguieria langsdorffi: A new frontier in antiviral defense for zucchini squash production.
Mais informações: elielson.bio@ib.usp.br, com Elielson Silveira; dyacsan@ib.usp.br, com Debora Santos
Matéria – Jornal USP, Texto: Gabriele Mello*
Arte: Diego Facundini**