Os ensaios em preservativos sintéticos
Os preservativos são um dos métodos contraceptivos do tipo barreira e que podem ser fabricados em látex natural ou de materiais sintéticos. Eles devem ser ensaiados para cumprir com a sua missão: impedir a ascensão dos espermatozoides ao útero, prevenindo a gravidez indesejada. Também é eficiente na proteção contra doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), como AIDS e HPV.
Por Mauricio Ferraz de Paiva*
O preservativo masculino é um envoltório para o pênis, que sempre teve seu uso muito difundido. É constituído de uma fina membrana, em forma de saco, geralmente de borracha (látex), que é colocado sobre o pênis ereto, antes do coito.
Alguns preservativos são lubrificados com silicone ou lubrificantes à base de água, e outros são revestidos com espermicidas. Podem ser encontrados em grande variedade de tamanhos, formas, cores e texturas. Já os de material sintético é mais fino, mais forte, mais resistente à luz e ao calor que o látex. Parece permitir maior sensibilidade durante o ato sexual e pode ser usado com lubrificantes à base de óleo.
No passado, o preservativo masculino foi idealizado com linho e tinha o objetivo único de prevenir algumas DSTs (século XVI). Somente no século XVIII sua ênfase foi na anticoncepção, conceito que durou até a década de 80. Coincidindo com o início da pandemia da AIDS e com a disponibilidade de diversos outros métodos mais eficazes, o preservativo masculino voltou a ter um papel preventivo na transmissão de vários os agentes causadores das DSTs, em especial na transmissão do HIV (vírus da imunodeficiência humana).
A NBR ISO 23409 de 05/2017 – Preservativos masculinos — Requisitos e métodos de ensaio para preservativos feitos de materiais sintéticos especifica os requisitos mínimos e os métodos de ensaio aplicáveis aos preservativos masculinos produzidos a partir de materiais sintéticos ou de combinações de materiais sintéticos e látex de borracha natural, que são utilizados com objetivos contraceptivos e como adjuvantes na prevenção contra doenças sexualmente transmissíveis.
Os preservativos sintéticos podem ser fabricados com 100% de materiais sintéticos ou com uma combinação de materiais sintéticos e látex de borracha natural, convém que o (s) material (is) utilizados em preservativos sintéticos sejam validados como uma barreira ao vírus da imunodeficiência humana (HIV), a outros agentes infecciosos responsáveis pela transmissão de doenças sexualmente transmissíveis (DST), e a espermatozoides. É essencial que os preservativos se ajustem ao pênis adequadamente, permaneçam no pênis durante a utilização, não tenham furos e apresentem resistência física adequada para não romper ou rasgar durante a utilização, para que eles possam ser considerados eficazes para os objetivos contraceptivos e para prevenir contra a transmissão de DST. Também é importante que sejam embalados corretamente para que estejam protegidos durante o armazenamento e etiquetados adequadamente. Todas estas questões são abordadas nesta norma.
Para ser seguro, é essencial que o preservativo e qualquer lubrificante, aditivo, materiais de marcação, coberturas, material da embalagem individual ou material em pó aplicado a ele não contenham nem liberem substâncias em quantidades que sejam tóxicas, com probabilidade de causar alergias (sensibilização), irritação local ou que sejam prejudiciais nas condições normais de armazenamento e utilização. Os preservativos são produtos para a saúde. Para garantir um produto de alta qualidade, é essencial que os preservativos sejam produzidos com um sistema de gestão da qualidade que utilize controle de projetos.
As referências podem ser, por exemplo, a NBR ISO 9001, a NBR ISO 14971, e a NBR ISO 13485. Orientações adicionais podem ser encontradas na ISO 16038. Os preservativos são produtos para a saúde não estéreis; entretanto, um ambiente limpo é essencial para minimizar a contaminação microbiológica do produto durante a fabricação e embalagem. Os preservativos podem ser projetados das seguintes formas, em uma lista que não pretende ser exaustiva: lisos, texturizados, lados paralelos, lados não paralelos, extremidade simples, extremidade com reservatório, secos, lubrificados, transparentes, translúcidos, opacos, coloridos, anatômicos, com costuras ou sem costuras.
Esta norma especifica os requisitos físicos de ensaios pré-clínicos, clínicos e de lote a lote, para preservativos fabricados com materiais sintéticos, incluindo preservativos fabricados com uma combinação de materiais sintéticos e látex de borracha natural. A aplicação dos requisitos de ensaio de lote a lote torna-se relevante somente após os requisitos pré-clínicos e clínicos desta norma terem sido atendidos. Os preservativos são artigos produzidos em massa e fabricados em quantidades muito grandes. Inevitavelmente, há uma certa variação entre preservativos individuais e uma pequena porção de preservativos em cada etapa da produção pode não atender aos requisitos desta norma.
Além disso, a maioria dos métodos de ensaio descritos nesta norma é destrutiva. Por estas razões, o único método praticável de avaliação de conformidade com esta norma é por meio de ensaios de uma amostra representativa de um lote ou de uma série de lotes. Os planos básicos de amostragem são fornecidos na ISO 2859-1. Referir-se à ISO/TR 8550 para as orientações para a seleção de um sistema, esquema ou plano de amostragem de aceitação, para a inspeção de itens individuais em um lote. Para os objetivos dos ensaios, a amostragem deve ser conduzida por meio do número do lote e não por meio do número de identificação.
Quando for requerida a verificação contínua da qualidade dos preservativos, convém que, em vez de se concentrar somente na avaliação do produto final, a parte envolvida também dê atenção ao sistema de qualidade do fabricante. Neste contexto, convém observar que a família NBR ISO 9000 e, em particular, a NBR ISO 13485 aborda as seções para um sistema de qualidade integrado. Os planos de amostragem devem ser selecionados de forma a fornecer um nível aceitável de proteção ao consumidor. Os planos de amostragem adequados são fornecidos nos Anexos A e B.
O Anexo A descreve os planos de amostragem baseados na ISO 2859-1 e é mais aplicável aos fabricantes ou compradores que avaliam a conformidade de uma série contínua de lotes. O nível completo de proteção disponível ao consumidor depende da troca para uma inspeção mais rígida caso seja detectada uma diminuição na qualidade. As regras de comutação não podem oferecer proteção completa para os dois primeiros lotes ensaiados, mas podem tornar-se progressivamente mais eficazes conforme o número de lotes em uma série aumenta. Os planos de amostragem no Anexo A são aplicáveis sempre que cinco ou mais lotes forem ensaiados.
O Anexo B descreve os planos de amostragem, baseados na ISO 2859-1, recomendados para a avaliação de lotes isolados. Os planos de amostragem no Anexo B fornecem aproximadamente o mesmo nível de proteção ao consumidor que aqueles fornecidos no Anexo A, quando utilizados com regras de comutação. Convém que estes planos de amostragem sejam utilizados para a avaliação de menos de cinco lotes, por exemplo, em casos de litígio, para objetivos de arbitragem, para ensaios de tipo, para objetivos de qualificação ou para tiragens curtas de lotes contínuos.
As condições de manuseio e armazenamento devem estar documentadas antes da coleta das amostras. É necessário conhecer o tamanho do lote a fim de obter da ISO 2859-1 o número de preservativos a serem ensaiados. O tamanho do lote varia entre fabricantes e é considerado parte do processo e dos controles de qualidade utilizados pelo fabricante. O tamanho máximo do lote individual para produção é de 500 000 unidades.
Esta norma não especifica o tamanho dos lotes, mas é possível que um comprador o faça como parte do contrato de compra. Os compradores são estimulados a especificar um tamanho de lote compatível com o sistema de gestão de qualidade do fabricante. Para qualquer produto novo ou que tenha passado por uma alteração significativa em sua formulação ou no processo de fabricação, devem ser conduzidas avaliações de biocompatibilidade de acordo com a NBR ISO 10993-1.
Devem ser conduzidos os ensaios de citotoxicidade de acordo com a ISO 10993-5, de irritação de acordo com a ISO 10993-10, e sensibilização (hipersensibilidade de contato tardia) de acordo com a ISO 10993-10. Muitos produtos sintéticos que foram estabelecidos como seguros, incluindo preservativos e luvas médicas, podem exibir uma resposta citotóxica positiva quando ensaiados de acordo com a ISO 10993-5. Ainda que qualquer efeito citotóxico possa ser motivo para preocupação, ele é, primeiramente, uma indicação de potencial para a toxicidade in vivo e um preservativo não precisa, necessariamente, ser determinado como inadequado para utilização com base somente em dados de citotoxicidade.
O preservativo deve ser ensaiado juntamente com qualquer lubrificante, aditivo, ou material de cobertura aplicado a ele. Os órgãos regulamentadores também podem especificar requisitos locais específicos. Devem ser utilizados laboratórios acreditados para os ensaios. Os órgãos regulamentadores podem requerer que os resultados sejam interpretados por um toxicologista qualificado ou outro especialista adequadamente qualificado.
O relatório de avaliação biológica deve justificar que o produto é seguro nas condições normais de utilização. Os preservativos que atendem aos requisitos desta norma podem ser utilizados para propósitos contraceptivos e para ajudar a prevenir as doenças sexualmente transmissíveis. Os fabricantes devem justificar quaisquer alegações adicionais para os seus produtos. Se um fabricante fizer uma alegação relacionada à eficácia ou segurança, então a alegação deve ser fundamentada por investigação clínica.
Os fabricantes devem disponibilizar as informações que justificam estas alegações para os órgãos regulamentadores, órgãos notificadores e autoridades de proteção ao consumidor. Se for requerida a verificação da quantidade de lubrificante em uma embalagem, deve ser utilizado o método fornecido no Anexo C. Os critérios de conformidade devem ser acordados entre as partes envolvidas.
O método no Anexo C também recupera parte do pó de cobertura no preservativo. Convém que seja estabelecida uma tolerância para isto quando os fabricantes ou compradores especificarem os níveis de lubrificante. Para o comprimento, quando ensaiado de acordo com o método fornecido no Anexo D, coletando-se 13 preservativos de cada lote, nenhuma medição individual deve estar abaixo de 160 mm.
Para a largura, quando ensaiado pelo método fornecido no Anexo E, medindo-se na parte mais estreita do preservativo na faixa entre 20 mm e 50 mm a partir da extremidade aberta, coletando-se 13 preservativos de cada lote, nenhuma medição de largura deve desviar da largura nominal estabelecida pelo fabricante em mais do que ± 2 mm. Quando o projeto do preservativo for tal que esta medição não puder ser feita de maneira confiável ou o ponto mais estreito nos primeiros 50 mm a partir da extremidade aberta do preservativo for a bainha, o método de medição deve ser fornecido pelo fabricante.
Se for requerida a verificação da espessura de um preservativo, ela deve ser igual à espessura alegada, quando determinada de acordo com o método fornecido no Anexo F, sujeita à tolerância de: ± 0,008 mm para preservativos com espessura menor do que 0,05 mm; ± 0,01 mm para preservativos com espessura entre 0,05 mm e 0,08 mm; ± 0,015 mm para preservativos com espessura maior do que 0,08 mm.
Para a avaliação pré-clínica, a análise de risco do produto deve ser conduzida de acordo com a NBR ISO 14971. A análise deve identificar as questões de segurança e eficácia, e deve abordar pelo menos as áreas nas quais os riscos estão acima dos riscos encontrados com preservativos de látex de borracha natural, em conformidade com a NBR ISO 4074. As propriedades de barreira do preservativo de barreira devem ser estabelecidas por meio de estudos de penetração viral utilizando condições de uso simulado e um vírus substituto adequado, como por exemplo, o bacteriófago phiX 174.
As propriedades de penetração virais devem ser comparadas àquelas de um preservativo de látex que atenda aos requisitos da NBR ISO 4074. Um procedimento adequado para conduzir estes estudos é fornecido no Anexo G. Convém que o número de preservativos de ensaio exibindo vazamento do fluido de suspensão viral acima do limite de detecção de 2 × 10-6 mL não seja significativamente pior do que para o preservativo de látex de controle. Podem ser utilizados procedimentos estatísticos apropriados para analisar os resultados, utilizando-se um intervalo de confiança de 95 %.
A biocompatibilidade para o produto finalizado e seus componentes deve ser estabelecida de acordo com as seções relevantes da NBR ISO 10993-1, da ISO 10993-5 e da ISO 10993-10. Os preservativos são um produto de superfície, com contato repetido com a mucosa e, possivelmente, com superfícies de tecido comprometido. Os ensaios devem indicar se o produto apresenta citotoxicidade, sensibilização, ou irritação da mucosa.
É possível que sejam requeridos ensaios adicionais, como por exemplo, para toxicidade sistêmica, de acordo com a ISO 10993-11, dependendo da natureza dos materiais utilizados ou para atender aos requisitos regulatórios locais. Se houver possibilidade de absorção sistêmica de quaisquer componentes ou resíduos, ensaios de mutagenicidade devem ser realizados. Os órgãos regulamentadores podem requerer que os resultados sejam interpretados por um toxicologista qualificado ou um pesquisador adequadamente qualificado.
O relatório de avaliação biológica deve garantir que o produto é seguro nas condições normais de utilização. Todos os dados gerados nestas investigações devem estar disponíveis para as autoridades regulamentadoras mediante requisição. O fabricante deve obter e disponibilizar, a pedido das autoridades regulamentadoras, dados de toxicidade de todos os aditivos e monômeros residuais, solventes residuais e impurezas conhecidas resultantes da manufatura do preservativo.
As planilhas de dados de segurança do material adequadas devem ser fornecidas, conforme requeridas, para os materiais utilizados na fabricação dos produtos em conformidade com esta norma. Para as investigações clínicas (utilização humana), o fabricante deve conduzir uma investigação clínica controlada aleatória, comparando o preservativo sintético a um preservativo de controle fabricado com látex de borracha natural. As investigações clínicas em humanos devem ser conduzidas de acordo com os requisitos regulatórios locais, assim como a ISO 14155.
A taxa de falha clínica (taxas combinadas de deslizamento e de rompimento) do preservativo sintético não pode ser inferior à taxa de falha clínica do preservativo de controle fabricado com látex de borracha natural. Para que seja demonstrada a não inferioridade, o limite superior do intervalo de confiança é unilateral de 95 % para a taxa de falha clínica do preservativo de ensaio menos a taxa de falha clínica do preservativo de controle deve ser menor ou igual a 2,5 %.
O limite deve ser calculado utilizando um método que leve em consideração as características únicas dos dados como: cada participante do estudo pode contribuir com dados da utilização de mais de um preservativo; taxas de eventos muito baixas. Para o preservativo de controle, a taxa de falha clínica deve ser menor do que 4,0 %. O preservativo de controle deve ser fabricado com látex de borracha natural e deve estar em conformidade com a NBR ISO 4074.
As propriedades físicas do preservativo de controle de borracha natural devem ser determinadas de acordo com a NBR ISO 16037. Para os produtos que estiverem no mercado antes da publicação desta norma, os fabricantes podem utilizar dados de investigações clínicas existentes. As informações sobre os estudos devem estar disponíveis para as autoridades regulamentadoras e governamentais mediante requisição.
Os fabricantes devem estabelecer os limites de volume e pressão mínimos apropriados para o preservativo específico baseando-se nas propriedades de rompimento no ensaio de insuflação do lote ou dos lotes utilizados para o ensaio clínico. Determinar as propriedades de rompimento no ensaio de insuflação do lote ou dos lotes utilizados no estudo clínico utilizando um tamanho de amostra de pelo menos 2.000 preservativos.
Se mais do que um lote for utilizado no estudo clínico, então as amostras devem ser tomadas de todos os lotes, com cada lote individual sendo amostrado de forma proporcional ao seu tamanho. Ajustar os limites de rompimento no ensaio de insuflação mínimos para 80 % dos valores do percentual 1,5 dos volumes e pressões de rompimento no ensaio de insuflação determinados anteriormente.
* Mauricio Ferraz de Paiva é engenheiro eletricista, especialista em desenvolvimento em sistemas, presidente do Instituto Tecnológico de Estudos para a Normalização e Avaliação de Conformidade (Itenac) e presidente da Target Engenharia e Consultoria – mauricio.paiva@target.com.br