Sistemas agrícolas sustentáveis são oportunidade de sequestro de carbono para o Brasil
No esforço mundial para combater as mudanças climáticas, a agricultura tem um papel essencial, em especial, a brasileira, com o vasto território e os ambientes diversos do País, de modo a atingir as metas junto ao Acordo de Paris, estabelecido em 2015 para contornar os efeitos do aquecimento global. Apesar da adoção de práticas mais sustentáveis, ainda há muitas oportunidades de melhorias, por meio da redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE), da remoção de carbono atmosférico e sequestro de dióxido de carbono (CO2) no solo através de sistemas agrícolas sustentáveis. Assim, pesquisadores do Centro de Pesquisa e Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), sediado na Escola Politécnica (Poli) da USP, publicaram um artigo na revista Green and Low-Carbon Economy sobre o programa de soluções baseadas na natureza que desenvolve desde 2021, entre outras soluções, integração entre agricultura, pecuária e floresta, uso de resíduos orgânicos e controle biológico de pragas.
O RCGI é um Centro de Pesquisa em Engenharia constituído pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e pela Shell.
O artigo foi escrito a partir de dados coletados em um evento presencial do RCGI realizado na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da USP, em Piracicaba, com os pesquisadores de universidades e instituições de todas as regiões do Brasil que participam do programa Nature Based Solutions (NBS). “Fizemos uma pesquisa participativa com os integrantes do NBS para saber deles os resultados que tinham até o momento e as perspectivas com relação a esses resultados”, conta Danielle Mendes Thame Denny, pesquisadora do Departamento de Ciência do Solo da Esalq, e primeira autora do artigo. “Os pesquisadores do RCGI que integram o NBS estão espalhados pelo País justamente para termos a coleta de dados, dos solos, das pastagens, dos sistemas integrados, com biomas diversos. Nesse levantamento apenas o ambiente amazônico ficou de fora, pois é estudado por outro grupo dentro do RCGI.”
Danielle Mendes Thame Denny – Foto: sites.usp.br
“É preciso passar de sistemas convencionais baseados em monocultura para sistemas integrados, que envolvam mais de um componente (culturas anuais, animais e/ou árvores) em uma mesma área, que forneçam diversos serviços ecológicos, entre eles o sequestro de carbono”, escrevem os autores do artigo. Segundo os pesquisadores, mais de 600 milhões de toneladas de GEE no Brasil são provenientes de fermentação, do cultivo de arroz, da gestão de resíduos animais, da queima de resíduos agrícolas e de solos manejados de forma inapropriada. Sistemas integrados entre lavoura, pecuária e floresta; plantio direto; plantas de cobertura, uso de resíduos orgânicos; controle biológico de pragas; e fertirrigação são algumas das técnicas sustentáveis propostas que podem levar as fazendas a vender, além de sua produção agropecuária, os “créditos de carbono”.
De acordo com os autores, a saúde do solo aumenta sua capacidade de sequestro de CO2 ao mesmo tempo em que promove o desenvolvimento socioeconômico em razão da produtividade maior a longo prazo. A transição para projetos regenerativos pode, assim, contribuir para o País cumprir as metas de emissão, ressaltam. “O Brasil tem a oportunidade de promover a bioeconomia circular sustentável e, fazendo isso, assumir uma posição de potência agroambiental”, concluem os pesquisadores.
Alta tecnologia
O programa deve durar ao mínimo cinco anos e inclui a adoção de alta tecnologia em suas investigações, com o uso de satélites e dos equipamentos do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, no interior paulista, para a análise dos solos. “Quando aplicamos uma técnica de manejo sustentável, além de conseguirmos mais produtividade com menos custo, há toda uma questão de longo prazo, com água, com saúde de solo, com mais biodiversidade”, afirma Danielle Mendes Thame. “Há uma série de serviços ecossistêmicos que na verdade são externalidades positivas. Eles acabam sendo multiplicadores dos efeitos positivos da implementação daquela técnica de agricultura sustentável.”
Os pesquisadores apontam que um quadro regulatório governamental pode ser uma força motriz para essa transição na agricultura e citam exemplos de instrumentos que podem ser usados para criar valor econômico para a agropecuária sustentável. Entre eles, estão pagamentos por serviços ambientais; normas voluntárias de sustentabilidade (acordos privados entre produtores, certificadoras e selos de qualidade); letras de crédito do agronegócio (LCA) verde; financiamento verde por certificados recebíveis do agronegócio (CRA).
Os autores defendem que o País deve dirigir suas estratégias políticas para aumentar a sinergia entre os negócios sociais e ambientais, promovendo uma transformação de longo prazo para uma agricultura mais sustentável, circular e tecnológica. “A saúde do solo é um dos principais pilares para atingir esses desafios complexos. Solos saudáveis são mais produtivos e resilientes, fazendo dos sistemas agrícolas integrados menos vulneráveis à mudança climática nas próximas décadas”, concluem. “Os projetos de NBS do RCGI trabalham na produção de dados empíricos para a tomada das melhores decisões e para transformar ciência e tecnologia em ação, coordenando, portanto, as intervenções técnicas e políticas de alto impacto que atendem às necessidades de todos os atores dos setores agrícolas.”
Além de Danielle Denny, que é pesquisadora da Esalq, assinam o artigo três professores da Escola: Carlos Eduardo Pellegrino Cerri, Maurício Roberto Cherubin e Heloísa Lee Burnquist. O artigo Carbon Farming: Nature-Based Solutions in Brazil pode ser lido neste link. O RCGI, além do apoio da Fapesp, conta com financiamento de empresas por meio dos recursos previstos na cláusula de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P,D&I) da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) dos contratos de exploração e comercialização de petróleo e gás. Atualmente estão em atividade cerca de 60 projetos de pesquisa, ancorados em sete programas. O centro, que conta com cerca de 600 pesquisadores, mantém colaborações com diversas instituições estrangeiras, como Oxford, Imperial College, Princeton e o National Renewable Energy Laboratory (NREL), além de projetos de longo prazo com centros de pesquisa dos Estados Unidos por meio da iniciativa Center 2 Center (C2C), financiada pela Fapesp e pela National Science Foundation. Saiba mais no site.
*Da Assessoria de Comunicação do RCGI, com edição de Júlio Bernardes
Matéria – Jornal USP, Texto: Redação*
Arte: Simone Gomes
Imagem – Foto: Tony Oliveira/Agência Brasília